sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

EFEMÉRIDE # 10


QUANDO O TERROR DESCEU AO TEJO...


É sábado, corre o dia 13 de Janeiro de 1759, e segundo CAMILO CASTELO BRANCO, "a aurora alvorejava uma luz azulada do eclipse d'aquelle dia por entre castellos pardacentos de nuvens esfumaradas, que a espaços saraivavam bategas de aguaceiros glaciaes. O cadafalso construido durante a noite, estava humido. As rodas e as aspas dos tormentos gottejavam sobre o pavimento de pinho. (...) Mostraram a D. Leonor, Marqueza de Tavora, o masso de ferro que devia matar-lhe o marido a pancadas na arca do peito, as thesouras ou aspas  em que se haviam de quebrar os ossos das pernas e dos braços ao marido e aos filhos, e explicaram-lhe como era que as rodas operavam no garrote, cuja corda lhe mostravam, e o modo como ella repuchava e estrangulava ao desandar do arrôcho. (...) O algoz vendou-a; e ao pôr-lhe a mão no pescoço, - não me descomponhas - disse ella, e inclinou a cabeça que lhe foi decepada pela nuca, de um só golpe". 



BRASÃO DOS TÁVORAS


Todo o grande homem pode carregar consigo um lado muito negro, e grande exemplo disso mesmo foi a figura controversa e polémica do MARQUÊS DE POMBAL, um empreendedor reconhecido e cuja obra fala por si, um inovador aclamado e cujas reformas foram visionárias mas porventura um déspota e tirano cujos horrores passaram as fronteiras, dele diria VOLTAIRE que cometeu actos de ridícula e pura selvajaria! 

Segundo Sebastião Carvalho e Melo, os principais inimigos da ordem estabelecida e da autoridade da coroa e portanto os grandes alvos a abater, eram certas famílias nobres e influentes - TÁVORAS  e DUQUE DE AVEIRO à cabeça - e os JESUÍTAS, a preponderante ordem religiosa que dominava a corte, os padres de Santo Inácio eram inclusivamente os confessores da família real.... E que melhor sinal dos céus poderia vir do que aquele atentado contra a vida de D. JOSÉ que ocorreu a 3 de Setembro de 1758, quando, curiosamente, vinha o soberano de mais uma entrevista amorosa com a sua amante, D. Teresa, irmã do Marquês de Távora?!




A RODA




Dois dos três autores do atentado foram capturados, e depois de interrogados sob diabólica pressão "denunciaram" os Távoras como os cabecilhas do golpe e cujo objectivo seria derrubar D. José e substituí-lo pelo Duque de Aveiro... E, embora tivessem essas pobres criaturas sido executadas sumariamente, os seus depoimentos foram considerados prova principal no futuro julgamento... 
Depois de mais de mil detenções para testemunho e castigo, confissões arrancadas sob tortura e tratos especiais, os supliciados foram tratados com a crueldade mais extrema e o rigor mais fanático que se podem imaginar, diante da população de Lisboa, ali, com o Tejo à beira.... Tudo foi permitido neste processo desde que servisse o propósito final: a eliminação dos opositores à ditadura do ministro...
Uma ignóbil e inaudita faceta da história portuguesa assim foi escrita naquele dia, um espectáculo gratuito de horror que atingiu o seu objectivo: servir de exemplo! Ainda hoje é exemplo do pior que a dita branda e tolerante alma lusa foi capaz de fazer...











A memória desse trágico acontecimento continua viva nos livros e crónicas sobre a história de Portugal, é certo, mas o que é extraordinário é que o pilar que assinala o preciso local de uma das mais cruéis façanhas da intolerância portuguesa seja talvez o monumento que, no mundo inteiro, esteja mais escondido, inacessível e votado ao ostracismo; lá resiste ele, como a têmpera dos injustiçados,  num minúsculo beco de 2 metros quadrados - BECO DO CHÃO SALGADO - mesmo ali, à beira dos Jerónimos, por detrás dos hambúrgueres, dos Pastéis de Belém e do Tejo, vendo os turistas, nacionais e estrangeiros, passeando indolentemente, alheios à história e ao local....








João Breve

(Cronologista de Valmedo)

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