A TOUPEIRA DE FEVEREIRO
VITÓRIA FORA, FUTURO EM CASA...
Se nas imediações da Luz a confusão era tanta que parecia ter chegado a hora do Apocalipse, imaginem então o ambiente que se vivia na sala onde se iria realizar a tão aguardada conferência de imprensa... Já não cabia nem mais uma mosca e muitos lá fora, sócios, populares, infiltrados e até jornalistas não creditados em busca de um furo, todos dariam a vida por uma metamorfose que os transformassem num pequeno insecto para ouvir e ver o grande acontecimento...
O pequeno auditório estava à pinha, jornalistas nervosos e demais em pulgas aguardavam ansiosamente pela entrada do palestrante, a famosa toupeira que só emergia das profundezas de mês a mês para opinar sobre a extraordinária e por vezes nebulosa saga do clube da águia... E então algo de extraordinário aconteceu, arregalaram-se olhos, abriram-se desmesuradamente as bocas e petrificaram-se os corpos porque uma voz rouca e profunda se fez ouvir, vinda sabe-se lá de onde, e dizia ela:
"Acabei de construir a minha toca e parece-me que ficou bem. Do exterior, só se vê um grande buraco que, na realidade, não conduz a parte nenhuma, depois de dar uns passos, chocamos com rocha firme, não vou vangloriar-me de ter concebido esta artimanha intencionalmente, ela foi, antes, o que restou de uma das várias tentativas de construção infrutíferas, mas finalmente parece-me vantajoso deixar este buraco sem protecção. É certo que muitas artimanhas são tão subtis que se anulam a si próprias, sei isso melhor do que ninguém, e, sem dúvida, é temerário chamar a atenção, através deste buraco, para a possibilidade de haver aqui qualquer coisa que valha a pena investigar. Mas, quem pensa que sou medroso e que foi por medo que construí esta toca, não me conhece."
Sem surpresa, um silêncio de morte instalou-se, mas que raio vem a ser isto, todos se interrogavam... E então a criatura, timidamente mas de ar confiante entrou sem hesitar e sentou-se... Virou a cabeça numa e noutra direcção, olhou para o tecto, inspirou e pousou o livro que trazia nas patas dianteiras. Esboçou aquilo que pareceu um sorriso para alguns mas que não passou de um esgar para outros e disse para o entrevistador ao seu lado:
- Peço desculpa, vinha entretido com o grande KAFKA e o seu delicioso conto sobre a toupeira, está a ver, sobre alguém da minha espécie, compreende?
O outro sorriu, um sorriso tímido é certo, e perguntou;
- Então, amiga toupeira, que nos diz sobre aquilo que se passou no último mês? Foi-se o VITÓRIA, emancipou-se o LAGE, despachou-se o Ferreyra e o Castillo, não se comprou ninguém...
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O futuro mora em casa... |
- Pois é - respondeu o bicho - e parece-me que o glorioso arriscou tudo nesta importante fase da sua vida, trocou as compras de inverno pela aposta nos jovens talentos da casa, despachou o amigo Rui que se tinha posto a jeito para tal, amigos como dantes, e apostou tudo em VITÓRIA FORA e FUTURO EM CASA, Félix, Jota, Ferro... E seria bom que a coisa começasse a resultar já amanhã em Alvalade com uma vitória fora porque uma boa intenção carece sempre de bons resultados!
- Então concorda com esta estratégia?
- Uma estratégia kafkiana, é certo, e em Março lhe responderei... - e a toupeira levantou-se devagar, lançou um último olhar sobre a plateia, inspirou de nariz levantado e abrindo o livro de Kafka que tinha ao colo, regressou para as profundezas deste mundo...
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