João Plástico
(Artista de Valmedo)
QUANTOS BICHOS VALE UM QUIVI?
Há quem diga que a Nova Zelândia é o país mais bonito do mundo e mesmo que não se concorde há que admitir que aquele arquipélago situado nos nossos antípodas cheira a paraíso, pelo menos foi-o até há 800 anos atrás quando os primeiros humanos aí desembarcaram... Então poucos mamíferos viviam naquelas milhentas ilhas onde reinavam aves que não voam, entre as quais uma espécie de papagaio e aquela que hoje é o símbolo do país, o quivi, também conhecido como quiuí ou kiwi e que é um bicho de aspecto muito peculiar: não passa de uma bola de pelo sem asas e com um bico fino muito comprido que quase bate no chão...
Notícia de rodapé - 2019 |
A civilização foi tomando conta do arquipélago e por volta de 1880 foram introduzidos nele furões e doninhas para combater a praga de coelhos que entretanto se tinha desenvolvido... O tempo foi passando e hoje esses e outros predadores invasivos que entretanto se lhes juntaram não só matam anualmente 25 milhões de aves como atacam também outras espécies autóctones como os lagartos, para além de ao darem cabo das colheitas de cereais causam à economia neo-zelandesa um prejuízo anual estimado em 3.3 biliões de dólares!
Vai daí, em Março de 2019 a Nova-Zelândia iniciou uma radical campanha de limpeza: até 2050 serão exterminados todos os bichos predadores que colocam em risco as espécies autóctones como o kiwi! Ora, passados 3 anos já se deve notar alguma diferença mas disso não há notícia, por enquanto... De alívio respiram entretanto os cidadãos neo-zelandeses que possuem gatos na família, eles que per capita são a nível mundial os que possuem mais gatos domésticos que, apesar de terem logicamente ficado de fora da lista de procurados, por sinal não deixam de contribuir para o problema pois também atacam as aves indígenas... E se já há quem tenha reparado nisso, serão eles o próximo alvo daqui a uns anos?
João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)
E por mais custoso ou longo que seja o nosso caminho acabaremos sempre por encontrar uma árvore que nos dê sombra, alento e talvez até alimento... Esta é minha velha conhecida, cumprimento-a na primeira curva quando busco o mar, um nobre, velho, solitário e sereno eucalipto que sempre, esteja sol ou chuva, pacatez ou ventania, luz ou escuridão, sempre me deseja um bom dia...
Jean-Charles Forgeronne
(Fotógrafo de Valmedo)
E PORQUE OS LIVROS NASCEM DAS ÁRVORES...
E porque hoje, para além de ser o Dia Mundial da Poesia, é também o Dia Mundial da Árvore, quem passasse ainda que distraído pelo largo central da Lourinhã ou pela Biblioteca Municipal seria surpreendido por uma dupla oferta: um vaso com um loureiro e um poema, este porque sim e a árvore porque o seu nome em latim parece estar na origem da palavra Lourinhã, Laurius... O loureiro, e basta dar um pequeno passeio pelos campos em redor para o constatar, é uma espécie autóctone muito abundante em todo o concelho e está representado no brasão da vila e presente em muitas histórias e lendas locais... Apanhado de surpresa ao entrar na biblioteca, o meu dia iluminou-se... Obrigado!
João Vírgula
(Leitor de Valmedo)
O GHANDI AINDA ANDA POR AÍ...
Afinal parece que Ghandi ainda anda por aí, dizem que pela exótica Turquia encarnado na figura de Kemal Kilicdaroglu, o recém escolhido líder de toda a oposição para concorrer às presidenciais de Maio e assim pôr cobro a duas décadas de ditadura à moda de Ergodan... Chamam a Kilicdaroglu o "Ghandi da Turquia" devido às semelhanças físicas e talvez seja a única comparação possível porque não lhe será fácil assumir-se como um líder espiritual como o foi o Mahatma indiano... E enquanto o original teve como colossal objectivo a independência do jugo colonial e a união de um país atolado em conflitos sociais e religiosos, o desafio deste sósia também não será fácil: num país também minado de extremos e ódios religiosos instaurar os direitos fundamentais, as liberdades individuais e a democracia... Um foi pacifista até ao fim, este proclama-se arauto de uma "força silenciosa"... A ver vamos...
EFEMÉRIDE # 96
UM PEQUENO MAS CONTAGIANTE GRÃO DE SAL
No dia 12 de Março de 1930, depois das orações e pelo fresco da manhã, Mohandas GANDHI e 78 discípulos seus puseram-se a caminho em direcção ao sul e iniciaram uma marcha de protesto contra o domínio colonial inglês na Índia, uma caminhada de cerca de 400 quilómetros em direcção ao mar e que ficaria depois eternamente conhecida como "A MARCHA DO SAL"... Durante essa odisseia, aquela grande alma ou "mahatma", como viria a ficar conhecido desde então, foi agregando milhares de pessoas à sua volta e os camponeses, apesar da sua miséria, iam abençoando os caminhos com flores e molhavam-nos com água para que não se levantasse poeira à passagem do mestre e os habitantes das aldeias engalanadas recebiam-no em festa e ouviam a sua doutrina revolucionária e pacífica, a satyagraha, para depois acompanhar o peregrino cortejo até à aldeia seguinte e assim, como uma bola de neve, um enxame humano ia lentamente avançando... E afinal tudo tinha começado por causa de um imposto sobre o sal e que atingia sobretudo os mais pobres, numa cega ganância e opressão colonialista os indianos estavam proibidos de produzir ou sequer de consumir o seu próprio sal sem ter de pagar uma exorbitante taxa!
"Em plena marcha do sal..." |
Passados vinte e quatro dias um homem magro de tanga, óculos redondos, sandálias e cajado entra mar adentro e ora, depois debruça-se e com as mãos em concha apanha uma mancheia de sal deixada na praia pela água evaporada, surpresa geral mesmo para os seus seguidores mais próximos que não esperavam aquela provocação, aos olhos imperialistas aquilo era um roubo, um crime... Milhares de pessoas o imitaram e nos dias seguintes mais de 50000 indianos seriam presos, incluindo o próprio líder, mas o objectivo de Gandhi estava alcançado, as notícias corriam rápido e numa nota sua escrita mesmo ali junto ao mar pode ler-se: "Quero a simpatia do mundo nesta batalha da justiça contra o poder"...
Ainda seria preciso esperar mais 17 anos para que a Índia conseguisse a independência, esse país colossal e analfabeto, cheio de conflitos sociais e religiosos e que Gandhi conseguiu despertar pela sua luta pacífica...
João Alembradura
(Historiador de Valmedo)
EFEMERIDE # 95
三十三 年 PÚBLICOS
Que bom chegar ao quiosque e encontrar o último exemplar do Público à minha espera e como a fria manhã de domingo ainda é curta fico a pensar se foi uma mera questão de sorte, talvez já muita gente tenha passado por ali e levado religiosamente debaixo do braço o seu exemplar, como dantes acontecia, ou se, devido às plataformas digitais e à cada vez mais diminuta leitura de jornais em papel aquele meu exemplar não seria a única oferta em dia de aniversário... Sim, o Público faz hoje XXXIII anos e ainda me lembro de ter comprado o primeiro número e desde então se tornou para mim uma referência pelo seu rigor e pela sua capacidade de inovação, foi de facto, à época, uma pedrada no marasmo jornalístico lusitano e estamos portanto hoje os dois de parabéns...
Nesta edição especial o Público volta a surpreender e junta a ancestral cultura chinesa à realidade do ocidente ao colocar a direcção editorial nas mãos de Ai Weiwei, um artista-activista e mundialmente conhecido como um dos maiores opositores do regime chinês e que escolheu o Alentejo para viver... Escultor, realizador, fotógrafo, arquitecto, até filósofo e outras coisas conforme a ocasião, Weiwei escolheu dez temas para abordar neste dia e aqui fica a sua reflexão sobre a morte:
"A morte é o definitivo, e muitas vezes desvalorizado, tesouro da vida. Concede à vida significado e objectivo, criando um sentido de urgência, uma apreciação da natureza fugaz da nossa existência, e expectativas para a perpetuação de diferentes formas de vida. Com a morte como um inevitável fim, podemos reflectir sobre o significado e a importância das nossas vidas, criar memórias e legados que mereçam ser lembrados e acarinhados..."
Vivamos então com urgência que o tempo voa como o dragão...
João Vírgula
(Leitor deValmedo)
O MUNDO É MESMO PEQUENO...
E num par de horas viaja-se por aí sem rédeas, à velocidade da luz partimos dos Açores com escala em Alcântara e aterramos em Torres Vedras, em pleno e cheio Bang-Venue... A noite começou com Pedro Puppe e a sua "música que parece que foi feita para a gente ficar ainda pior", temas entre o triste e o depressivo tocadas a guitarra única e inspirados pela vivência açoreana do cantautor e produtor... Depois do choque inicial a coisa entranha-se e dei por mim a assimilar aquelas palavras vividas que nos mostram que a tristeza é afinal tão natural como a alegria e que é importante viver bem com as duas sob pena de se perder o juízo...
UM OSSO DURO DE ROER
"Eu, encarando o ossobuco..." |
James
(Cão de Valmedo)
SOPINHA, SOPA, SOPÃO...
Zuppa, Minestra, Minestrone, tudo significa sopa em italiano mas por terras de pizzas e pastas o que não faltam são sopas em abundância e todas diferentes... A ancestral zuppa era uma sopinha, um caldo de poucos ingredientes servido por cima de pão e que se tornou uma popular refeição em tempos difíceis e que depois evoluiu para a minestra, uma sopa bem mais consistente devido à grande variedade de legumes que entram na sua composição e, geralmente, à adição de massa ou arroz... Depois ainda temos o minestrone, um sopão em que à catrefada de legumes da época se junta também carne... Esta receita que vos trago não leva massa ou arroz porque, sincera opinião pessoal, não há necessidade e utiliza ossobuco, palavra italiana que significa literalmente osso-buraco e também conhecido em português como chambão...
MINESTRONE à VALMEDO
Ingredientes para o caldo:
Numa panela colocar a carne, a cebola cortada ao meio , o tomilho e o louro; regar com um fio de azeite, temperar com sal e pimenta, juntar a água e cozer durante 45 minutos; no final adicionar o feijão, misturar muito bem e reservar...
Ingredientes para sopa:
Numa panela aquecer um fio de azeite e juntar a cebola usada no caldo picada grosseiramente e os alhos; passados 5 minutos juntar todos as cenouras e os aipos e deixar refogar 5 minutos; depois adicionar as curgetes, as batatas e o feijão-verde e refogar mais 3 minutos; depois juntar os tomates, envolver bem e refogar mais 5 minutos; juntar o caldo e cozinhar em lume brando até os legumes ficarem tenros e a meio da cozedura juntar a carne aos pedaços, o feijão e a salsa; entretanto delicie-se com os aromas que invadem a cozinha e quando estiver tudo bem cozido desligar o lume e deixar repousar 10 minutos antes de servir a iguaria...
Et bon appétit...
João Ratão
(Chef de Valmedo)