"Natureza-Morte" |
Jean-Charles Forgeronne
(Fotógrafo de Valmedo)
SONETO DAS PEQUENAS COISAS
TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XXX
Ali está ele, o pote, ao lado da porta de entrada e quem o vê do outro lado da estrada que corta os Campelos a meio não imagina o reduzido espaço do interior, pequeno mas acolhedor e sempre cheio, e se mais lugares houvesse... Convém pois reservar porque quem ali abanca gosta de comer, de usufruir com tempo os prazeres da boa comida e de conviver ou não fosse um sítio ideal para jantares de grupo e reuniões familiares, desta vez ali pousaram os Snookerentos que já há alguns anos, em épicas disputas, abrilhantam com tacadas de génio e outras avarias as cálidas noites passadas na Associação do Nadrupe...
E por entre acesos debates e partilha de vivas memórias de aventuras passadas (eles foram os extintos Tálentos que já não correm, ainda são Pedálentos mas têm a bicicleta pendurada na garagem e agora combinam-se projectos de futuro enquanto Radicálentos) lá foram chegando em doses generosas as iguarias para a mesa... No POTE tudo merece ser provado e se o bacalhau à casa me encheu as medidas não pude evitar uns olhares de inveja para as costeletas de bovino com que outros se deliciavam ou para o bacalhau com broa mesmo à minha frente... E claro, várias outras opções ficaram prometidas para futuras visitas...
No final, e depois de um banho de simpatia por parte do António Fortunato, o proprietário e chefe de sala, ainda enderecei os parabéns à sua esposa, Dina, cozinheira e doceira, à conta de um dos melhores pudins que já comi, um fantástico pudim de café! E claro, outras doces opções ficaram por lá à minha espera...
João Ratão
(Chef de Valmedo)
Paço da Rainha, Lisboa |
O PAÇO DA RAINHA DO CHÁ
Apesar de hoje no palácio estar instalada a Academia Militar ainda se sente por aquelas bandas a atmosfera real do tempo da rainha que deu a conhecer e instituiu a tradição do chá das cinco na Inglaterra, quem por ali deambular encontra-a imortalizada num busto que faz lembrar a Pipi das Meias Altas...
Em contraponto, do outro lado da rua, fruto dos modernos tempos, abundam casas devolutas, prédios em ruínas e outros, muito poucos, em recuperação... E por entre os sem-abrigo que dormitam nos bancos de jardim a única coisa que destoa é o Observatório Astronómico da Bemposta, ainda bem conservado e popularmente conhecido como a Torre do Relógio, construído no século XIX para que os futuros militares complementassem os seus estudos científicos, já então o Palácio servia de sede à Escola do Exército e da Guerra...
João Conde Valbom
(Olisipógrafo de Lisboa)
UM PORTUGUÊS CALCANDO A CALÇADA!
"Este mundo-cão está cheio de macambúzios ambulantes!", tenho a mania de dizer em voz alta para mim mesmo sempre que me ponho a observar quem passa e correndo o risco de alguém que me ouça declarar-me maluquinho... De facto assusta a quantidade de pessoas que por aí caminham ensimesmadas de olhas fixos no chão, sem um olhar sequer para as árvores, para as aves, para o céu, para as flores, para os animais e sobretudo para as outras pessoas que com elas se cruzam e se, dizem os psicólogos e outros especialistas em postura corporal, quem tem o hábito de andar de carranca com a cabeça baixa e olhar fixo no chão são pessoas tímidas, outras tristes e outras solitárias que se recusam a encarar o mundo de frente, então concluo pela amostragem que a saúde mental anda muito por baixo...
TEM MEDO? COMPRE UM JAMES!
CURIOSIDADES DO MUNDO-CÃO - XLVI
O MEDO, ESSA BOA SENSAÇÃO!
"O Grito" - Munch, 1893 |
TERAPIA M𝄞SICAL
Começo por declarar que a culpa desta crónica hospitalar não é minha, antes é da música, não apenas de uma música em particular mas da música em geral que, estou desconfiado, parece ser o cimento que liga toda a beleza, todo o mistério e todas as incongruências deste mundo-cão e ao qual que lhe dá muitas vezes não só um sentido mas também um refúgio para expiação dos meus pecados... Querem um exemplo? Reparo agora que, enquanto matraco este pobre teclado e as palavras vão aparecendo no monitor, o faço ouvindo Vanessa Daou cantando um poema da feminista Erica Jong numa gravação dos "Muitos Mundos" na Antena 3 e de facto, se estivermos atentos, todos somos confrontados diariamente com muitos mundos, como foi o caso quando ela, carregando o seu mundo, entrou na Sala de Colheitas para fazer análises...
Mas no caso da Ivania, assim se chamava a grávida sentada na minha cadeira, a cartilha foi imediatamente posta de parte quando me mostrou o braço tatuado para a picada e eu leio em voz alta para ela também ouvir:
João Butterfly
(Analista de Valmedo)
O MISTÉRIO DA ESTRADA DO TOXOFAL
Coitado do carteiro que ali tiver que entregar uma carta registada e que bem pode morrer à espera que alguém o atenda! Sigo viagem e enquanto não encontro ninguém que me esclareça o significado do insólito achado vou matutando naquele mistério e baseado na minha própria experiência só me vem uma solução lógica à cabeça: porventura será um grito de revolta por causa de uma merdança! Uma merdança é uma herança de merda, um presente envenenado que só traz chatices e nenhum proveito a quem a recebe e ainda que não a queira herdar, por exemplo uma casa velha e ilegal como me aconteceu, ser responsável por uma merdança pode causar aos mais frágeis sérias úlceras nervosas, para a legalização de umas ruinas é preciso entrar com todo um conjunto de projectos, autorizações, pareceres e taxas para aqui e para acolá como se fosse construir um palácio novinho de raiz! A burocracia e os custos relacionados com a habitação e até terrenos rústicos é tal que desmoraliza o santo mais paciente neste país alicerçado nos impostos; e depois, quem quiser vender uma casita por mais modesta que seja tem que ter consigo a bendita licença de utilização, esse santo graal que só serve para se desistir em muitos casos antes de se cair na penúria e então se a casa foi construída depois de 1951, ainda que em ruínas, o calvário ainda é maior, apenas estão isentas as contruídas antes daquele ano, vá lá encontrar-se lógica ou proveito nesta insanidade! Ora, agora que estou a chegar a casa sinto orgulho nas minhas células cinzentas e convenço-me de que resolvi o mistério: alguém herdou aquelas ruinas que outrora foram uma casa construída em 1956 e para se desfazer daquilo tem que fazer obras e obter licença para tal ou então demolir, em qualquer dos casos perde tempo, saúde mental e rios de dinheiro nas taxas e mais taxas que o esperam... Aquela caixa de correio é portanto, diz o meu Poirot interior, um monumento irónico às merdanças deste mundo-cão! Será?
João Abelhudo
(Investigador de Valmedo)
QUEIMANDO MAUS ESPÍRITOS E BRUXAS
A luz pálida do entardecer embelezava o vale e enquanto descíamos aos ziguezagues pelo caminho de terra bastante sulcado pelas últimas chuvadas tive a sensação de que estávamos prestes a entrar noutra dimensão e tentava convencer-me de que não estava apenas a ser sugestionado pelo carácter especial da reunião, parecia-me mesmo que iríamos em breve mergulhar num mundo de maravilhosas coisas e como a escuridão ainda não engolia o cenário já se vislumbrava lá ao fundo os contornos encantadores da Capa Negra...
Os amigos iam chegando alegres e carregados de iguarias para a celebração, calhava ser sábado e dia de descanso para alguns, de folga para outros e dia de santo magusto para todos... E enquanto a mesa ia ficando composta e a Dininha andava lá fora desafiando o lusco-fusco de volta das brasas para a prometida castanhada, iam nascendo como cogumelos conversas de actualização dos acontecimentos desde a última reunião, há sempre novidades acerca deste mundo-cão que gira depressa demais...
Mas esta noite em particular trazia outro aliciante, depois das castanhas e da ceia entraria em cena a saudosa queimada, ideia da Jú e coisa que já não era feita por nós há décadas... E que melhor ocasião para encenar esse ritual de afastamento de maus espíritos, bruxas e maus-olhados do que uma reunião de amigos e em que alguns deles têm tido tão pouca sorte entretanto que até parece terem sido amaldiçoados? Obriga a tradição oriunda da Galiza e do norte de Portugal que após a ceia e na obscuridade da noite se reúnam os comensais ao redor do pote onde se vai elaborar esse purificador licor, de preferência com as luzes apagadas...
Manda a lenda que num pote de barro se deve botar a aguardente (e neste caso o Jorge Humberto fez questão de ser uma de medronho lá do Estreito, mal empregada pensei eu!) e o açúcar amarelo na proporção de 120 gramas por cada litro; depois juntam-se pedaços de maçã, uvas, cascas de limão ou de laranja e alguns grãos de café por moer; mexe-se tudo; à parte, colhe-se uma porção da bebida com uma concha, sem limão nem café, e pega-se-lhe fogo; seguidamente introduz-se a concha a arder no pote e mexendo devagar vai-se permitindo que as chamas do álcool subam em cascata... Espera-se que a queimada se apague por si própria e depois há que recitar o esconjuro, desta feita a meu encargo:
LIVROS 5 ESTRELAS - XXXVI
"Há um incêndio no interior de um teatro. O palhaço sobe ao palco para avisar o público. Eles pensam que é uma piada e aplaudem. O palhaço repete e é aplaudido ainda com mais entusiasmo. É como eu penso que o mundo chegará ao seu fim: sendo aplaudido por testemunhas que acreditam que tudo não passa de uma piada!"
Kierkgaard |
FELIZES MOMENTOS ANTI-DEPRESSIVOS
João Catarino é professor de Desenho e Design mas é especialmente conhecido pelo seu trabalho como ilustrador em diversos jornais, revistas, livros e até canais de televisão e tem acima de tudo uma maravilhosa mania, para onde quer que vá, nos seus curtos passeios ou em viagens mais longas, leva um caderno para desenhar... Ora, ao longo de anos acumulou cadernos de desenhos sobre os mais variados ambientes mas especialmente sobre a orla costeira, a verdadeira linha de fronteira entre dois mundos...
"Os Cadernos" |
"Praia da Almagreira", Peniche, 2023 |
João Plástico
(Artista de Valmedo)
OS EUROS, OS SONHOS E OS ANOS...
Hoje é um dia histórico, isto é, este dia 6 de Novembro de 2023 ficará definitivamente para a posteridade porque mesmo que nada de revelante mais aconteça é o dia em que nasce o EURO DREAMS! E eu, que arrisquei logo a sorte quando chegou o velhinho Totoloto ainda no século passado e que voltei depois a jogar com fervorosa fé no primeiro sorteio do apetecível Euromilhões há vinte anos atrás, não poderia faltar agora ao desafio de inaugurar o novel EuroDreams! Eis a prova:
Nunca fui adepto da lotaria embora sempre nutrisse um fascínio pelos cauteleiros lisboetas quando há muito tempo atrás me cruzava com eles durante as férias juvenis na capital do reino e especialmente pelo anúncio cantado dos prémios transmitido em directo pela telefonia de então, não sou nem de longe viciado na raspadinha embora as compre e das mais baratas quando me dá a veneta, não frequento sequer casinos mas tenho uma paixão pelo jogo, gosto de jogar a tudo, a dinheiro, à honra ou a feijões, não interessa, seja às cartas, aos dados, ao snooker ou aos matraquilhos, desafiar a sorte e aparar o azar faz parte do jogo da vida; às vezes alegres, outras vezes tristes, mas sempre desfrutando.... O fascínio do jogo, do desafio, da felicidade...
NOMES, SIGLAS, ACRÓNIMOS...
À primeira vista parecem gansos, mas será que são mesmo gansos?
EFEMÉRIDE # 98
Catedral de Salamanca |
"Terramoto de 1755" - João Glama |