sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

O Pombo-das-Escarpas

 


EFEMÉRIDE # 87


QUANDO OS POMBOS CHEGARAM...


Quem, logo no início dos passadiços das Escarpas da Maceira, por instinto ou curiosidade decide abandonar os bonitos degraus de madeira artificial e subir à esquerda pelo antigo carreiro de terra batida até ao cimo do monte, e depois de uns duzentos esforçados passos que equivalem a uns míseros cem metros, será surpreendido por uma estrutura cilíndrica que o fará lembrar um moinho sem velas... "Que raio é isto?", interrogar-se-á...







A resposta ser-lhe-á então dada quando se aproximar mais um pouco e vislumbrar a placa comemorativa sobre a porta ferrugenta: trata-se, afinal, de um abandonado pombal construído em Janeiro de 1959 e que, passado apenas um mês, decorreria então um solarengo mas ventoso 26 de Fevereiro de 1959, passam hoje exactamente 62 anos, seria inaugurado com a sua primeira remessa de 75 pombos, ao que consta da raça especial barcas, uma das 350 raças diferentes criadas pelo homem desde que domesticou o selvagem pombo-das-rochas vai para uns dez mil anos! Pompa e circunstância terão havido certamente, nem que fosse uma singela mas genuína comemoração com pão caseiro da região acompanhado de queijo ou chouriço, um brinde à prosperidade e um foguete lançado aos céus da Maceira, mas hoje não se encontram registos de tal acontecimento, talvez só esteja mesmo gravado na memória de alguns idosos maceirenses que ainda se lembram de tal acontecimento... 



Ora, como os pombos nos meios rurais não duram mais de 15 anos (nos ambientes citadinos então não passam dos cinco!) só se pode concluir que aqueles pombos heróis há muito desapareceram, e ainda que também os seus descendentes directos há muito se foram, aliás, as quatro gerações seguintes desses primordiais pombos da Maceira há muito que voam noutra dimensão, e de facto, garanto eu, nas muitas excursões que tenho feito aqui por estas belíssimas escarpas nunca ouvi um arrulhar por mais longínquo que parecesse e nunca vislumbrei um pombo que fosse pelos ares da Maceira... Nem sequer se vê um falcão por aqui, ele que se lança em voo picado a mais de duzentos quilómetros por hora em direcção à sua presa predilecta... Mas depois, ao olhar para o mundo encantado lá em baixo e vendo  o Alcabrichel serpenteando suavemente por entre escarpas e salgueiros pensei: "E se os descendentes dos pombos da Maceira estiverem apenas a sobrevoar o mar, lá em baixo?"





"Escarpas" - Jean-Charles Forgeronne




João Atemboró

(Naturalista de Valmedo)

A baleia...

 

E A BALEIA POUSOU NA AREIA BRANCA...


Quem, como eu hoje fiz, subir os 115 degraus da escadaria que dá acesso da Praia da Malhada até ao alto da arriba irá decerto parar algumas vezes e olhar com outra atenção para trás em direcção ao mar revolto, é que a subida será inevitavelmente feita por entre ecológicos escritos na parede que alertam para a fragilidade do planeta e para a necessidade de o preservarmos... Não se sabe quem escrevinhou mas ainda bem que o fez, para mim aquele manifesto tem ar de juventude irrequieta e activa e isso alegra-me porque não pode haver melhor sinal e garantia de que o futuro poderá ter ainda alguma viabilidade, afinal serão as gerações mais novas que irão herdar esta casa comum e única que nós, mais velhos, lhes vamos deixar já com muitas doenças e algumas delas incuráveis!


"O planeta não é reciclável" - Jean-Charles Forgeronne


Infelizmente, o curioso é que alguém que não esteja suficientemente informado e alertado para os gravíssimos problemas relacionados com a poluição dos oceanos e mares pode facilmente entrar em negação e  desprezar aquelas chamadas de atenção escritas numa singela escadaria de uma praia pouco frequentada (e ainda bem, acrescento...), é que ao olhar para trás e ao constatar toda aquela beleza e serenidade podemos facilmente duvidar de que algo esteja mal e até convencermo-nos de que tudo não passa de exageros!



"Praia da Malhada" - Jean-Charles Fotgeronne

Mas continuemos a agradável subida, eis que venço o último degrau e chegado ao alto viro à direita e desço pela Alameda do Golfinho e mesmo à entrada da Praia da Areia Branca, defronte da Pousada da Juventude, (e que melhor sítio?, pensei eu depois), ali estava ela, primeiro indefinida porque é transparente ou não fosse feita de arame de malha fina mas depois pujante na sua mensagem, uma BALEIA que deu à costa qual mensagem desesperada numa garrafa lançada de um mar distante... É que esta baleia mostra através da sua transparência o lixo plástico que intoxicam as baleias reais, aqueles monstros marinhos com milhões de anos de história no lombo... No mínimo, dá para pensar um pouco, ou não? 



"A BALEIA" - Jean-Charles Forgeronne

E assim, em que acreditar, ou na praia da Malhada azul e lindíssima, imaculada e eterna, ou na baleia condenada à morte plástica? O melhor, a meu ver, é acreditar nas duas e fazer algo enquanto é tempo, nem que seja escrevinhar numa singela escadaria que dá acesso ao mar azul, por enquanto...


João Green

(Ecologista de Valmedo) 

Malhada deserta

 




Jean-Charles Forgeronne

(Fotógrafo de Valmedo)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

O Fojo

 

TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XII


A RATOEIRA E OS TORDOS DO ALVIELA...


Quem, ao passar pelo centro de Parceiros de São João e naquela curva diante do famoso restaurante da aldeia decide abandonar a Estrada Nacional 3 e cortar à direita ou à esquerda, conforme o sentido, talvez não saiba que ali mesmo nasce a Estrada Nacional 361, rota que o levará a atravessar os concelhos de Alcanena, Alcanede, Rio Maior, Caldas da Rainha, Cadaval e Bombarral, até desaguar na rotunda defronte da Adega Cooperativa da Lourinhã, a escassos metros de Valmedo, mas o que interessa mesmo aqui é a curiosidade de bastarem poucas centenas de metros decorridos depois dessa decisão tomada para, ao entrar em Casais Romeiros, se reparar numa casa térrea e modesta à beira da estrada e à sombra de um majestoso e vetusto pinheiro, é o FOJO, casa conhecida primeiro apenas como a taberna do Fojo e onde se procurava abrigo à beira da generosa lareira nas tardes invernosas ou se refrescavam os humores sujeitos aos tórridos calores dos estios ribatejanos e depois, muitos anos mais tarde, quando para além dos petiscos de final de tarde se aventou a servir pastagens mais elaboradas, como a casa de pasto do Fojo, mas isto serve apenas para os locais que conhecem a história da família porque para os viajantes ocasionais e turistas de passagem ela se apresenta hoje como a casa de pasto "O PINHEIRO"... 




Ora, que melhor nome para dar a um sítio como este se afinal, segundo o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, fojo significa uma armadilha para caça de animais ferozes que consiste num buraco profundo, cavado no chão e disfarçado com ramos e galhos? É que nem é preciso ser feroz, qualquer alminha por mais santa e pacata que seja pode facilmente cair na ratoeira tais são os aromas que daquelas chaminés se desprendem, tais são as iguarias que respeitam a tradicional cozinha portuguesa e confeccionadas com esmerada mão da Gouxaria, seja carne ou peixe, polvo ou bacalhau que a coisa depende do que houver de melhor no mercado de ocasião...  Além disso, a simplicidade e a generosidade daquela gente cativa qualquer comensal, simpatia a rodos e um até à próxima e volte sempre, e acabamos por voltar sempre, é irresistível, é uma romaria! E por mais feroz que seja o apetite ninguém sai dali insatisfeito...








Da última vez que lá tinha caído tinha sido presenteado com um robalo na brasa, acompanhado de batata cozida, legumes e uma genuína alface daquelas terras do sopé da serra de Santo António, para além, claro, de um branco fresquíssimo e perfumado, que nisso de pinga aquela gente sabe... Agora, de viagem há poucos dias atrás e neste miserável período de confinamento fui agradavelmente surpreendido pelo atendimento take-away, simpático e eficiente como sempre mas que não deixa de ser como quem diz: toma, paga e desaparece daqui! 






E lá tive eu que desandar dos Casais Romeiros até um sítio tranquilo para degustar o borrego no forno que ia ali a fumegar no banco do morto, onde parar, onde comer tranquilo aquela maravilha, perguntava-me eu e não me ocorreu outra coisa do que demandar os Olhos de Água, as nascentes do Alviela, já ali e em caminho...







Abancado à beira do rio, não sei precisar se a violar alguma lei confinatória, mas agora isso também já não interessa, nunca um borrego no forno me soube tão bem porque até sabia a pecado, e sabem quem me deu razão? Os inúmeros TORDOS que como por magia num instante se abeiraram de mim vindos do nada! Afinal quem disse que os pássaros não gostam de um grande petisco? De repente eram dois no chão outonal atapetado de folhas, depois mais três ou quatro e empoleirados nas árvores nuas então eram às dezenas, e claro, como do meu repasto só sobraram uns míseros ossos não consegui ser-lhes muito útil.... Mas ficou a experiência, os tordos cheiram muito bem e são uns óptimos críticos gastronómicos, afinal o borrego estava soberbo!







João Ratão

(Chef de Valmedo)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Texugo, cão, porco...

 


 ENCONTROS IMEDIATOS DO CORREDOR


Vendo a cada custosa passada a copa das árvores a crescer lá no cimo da subida para Valmedo ou afogando-se lentamente pela íngreme descida que desagua no mar da Peralta, explorando os segredos do planalto das Cezaredas ou equilibrando-se pelos trilhos das falésias entre Paymogo e São Bernardino, o corredor que explore a natureza selvagem deste oeste profundo não consegue fugir a um fatal destino, pode demorar o seu tempo mas vai coleccionando encontros imediatos com muita bicharada bravia que felizmente ainda vai resistindo às ameaças que as intensivas actividades humanas representam para os seus habitats naturais... De facto, nesta nossa vidinha cada vez mais tecnológica e virtual vamo-nos esquecendo que a natureza que nos rodeia, muitas vezes até à volta da nossa própria casa como é o meu caso aqui em Valmedo, está viva e cheia de bicharada curiosa, que o diga eu que nas minhas corridinhas e caminhadas por aí já me cruzei com um javali a atravessar o caminho à minha frente e que nem reparou em mim, já dei de caras com uma gineta em contra-mão em pleno trilho do Vale da Cornaga, já surpreendi um cão vadio sentado a contemplar o sol poente, parecia estar ele a fazer o seu yoga e que depois ao dar por mim se revelou ser afinal uma raposa tal era o seu magnífico rabo de uma pelagem rubra, para além de asnos tresmalhados, rebanhos de cabras, cavalos e éguas a comerem das suas banheiras e outros bichos mais, não falando das cobras e outros répteis ou das magníficas aves marítimas que revolteiam nas falésias quando o exercício é à beira-mar ou então das águias e outras rapinas que avisto quando demando a floresta ou ainda das perdizes aos magotes e aos mais raros mas pouco assustadiços faisões... E cada um desses encontros imediatos me deixa fascinado e torna o dia especial, pena é que só aconteça de vez em quando...



"O texugo de Valmedo" - Jean-Charles Forgeronne


Ontem pelo lusco-fusco, já em ritmo de recuperação e satisfeito pelo bom treino que tinha acabado de fazer, vinha a descer do Toxofal quando ao aproximar-me de casa noto ao fundo algo estranho, em cima de uma pedra abandonada em cima de um poste há muito abandonado e num terreno há muito abandonado alguém ali abandonara há pouco um animal! Que raio, ouvi-me dizer em voz alta, que vem a ser isto?  Tinha o tamanho de um cão mas não o era, nem tão pouco um gato por maior que fosse e depois, ao reparar nas patas e nas garras tive a certeza que era um bicho do mato, mas o que seria? Do focinho, uma mistura de focinho de cão e focinho de porco, escorria um fio de sangue ainda líquido, ou o bicho tinha sido atropelado ou então morto à paulada, pensei, mas porque raio estava ali exposto? Bom, talvez fosse um sinal de aviso para os da sua espécie como que a mandá-los embora, é que por ali há muita capoeira e a criatura tivesse sido surpreendida a atacar a criação... O mistério foi-me desvendado esta manhã quando encontrei o meu vizinho Serralha, personagem simpática e curiosa ou não passasse ele quase todos os dias a apascentar de varapau na mão as suas galinhas e perús por ali ao ar livre como se de um rebanho de ovelhas se tratasse, para além de ocasionalmente também passear o seu gato assustadiço de coleira ao pescoço como se de um cão se tratasse... E à minha pergunta respondeu-me ele: "Este bicho é um TEXUGO-PORCO"!  E que tinha sido atropelado lá em cima no estradão e que havia duas espécies de texugo: o TEXUGO-CÃO e o texugo-porco! Cada um foi à sua vida e eu, curioso e inquieto, assim que pude fui investigar: era de facto um exemplar da espécie texugo europeu, de baptismo científico Meles meles e primo dos furões, das doninhas e das lontras. Embora apresente uma dentição típica dos carnívoros o texugo é omnívoro, tanto janta pequenos mamíferos como ratos e outros pequenos roedores como pode cear insectos, minhocas ou larvas e além disso, como é de boa boca, também se avia tanto com répteis e anfíbios como com pequenas aves, não descurando ainda frutos e raízes...Além disso, adora mel, o guloso!





Em relação à distinção popular entre o texugo-cão e o texugo-porco não passa de confusão porque trata-se da mesma espécie, só que de Inverno o bicho engordou e apresenta uma pelagem mais espessa e chama-se-lhe então porco enquanto no Verão, mais magro e com menos pêlo, chama-se-lhe cão! O texugo é também de uma coragem a toda a prova, luta sem tréguas e sem medo perante serpentes venenosas, lobos, raposas e até ursos, vencendo muitos desses combates e de entre muitas outras curiosidades dignas de serem descobertas salienta-se o facto de enterrar os seus mortos! Apesar de tudo, as principais causas de morte da espécie são os atropelamentos por automóveis e a desflorestação!

Provavelmente não me cruzarei nunca mais com outro texugo, afinal é raro encontrá-lo porque é um animal de hábitos nocturnos mas se tal acontecer espero que seja aos saltos em plena floresta aquando de uma corrida e não à beira de uma estrada qualquer...


João Atemboró

(Naturalista de Valmedo)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Memórias


AUTO-RETRATO DO CORREDOR ENQUANTO ESCRITOR DE FUNDO





 Jean-Charles Forgeronne

(Fotógrafo de Valmedo)

Escrever a correr

 


LIVROS 5 ESTRELAS - XXIII


HASHIRU KOTO NI TSUITE KATARU TOKI NI BOKU NO KATARU KOTO...


Para escrever estas linhas tive que ir correr anteontem, ontem e hoje e tudo por causa de um livro que acabei de ler, precisei de várias coisas que a corrida em modo solitário pela natureza me proporciona muitas vezes: falar em voz alta comigo mesmo e ouvir-me, colocar algumas ideias em ordem, descobrir alguma inspiração e ainda desta vez, desvendando o irresistível apelo da curiosidade e como se fosse a primeira vez que corria, ia-me interrogando se tinha as mesmas sensações que aquelas que o corredor da história relatava... Pois é, embora seja cada vez mais raro, o que ainda torna mais encantatória a descoberta, felizmente de vez em quando cai-nos nas mãos um daqueles livros que nos enche as medidas porque literalmente parece que foram escritos a pensar em nós e neste caso até dou a pensar para comigo que se tivesse a arte e o engenho poderia eu próprio tê-lo escrito de tal forma me identifico com a personagem e o enredo... E não serei o único certamente... Chama-se no original "Hashiru koto ni tsuite kataru toki ni boku no kataru koto", que é como quem diz "What I talk about when I talk about running", um título emanado de "What we talk about when we talk about love", livro de contos de Raymond Carver, escritor idolatrado e traduzido para japonês por HARUKI MURAKAMI. Não lembra ao diabo mas coisa que já não surpreende no criativo mundo da tradução para português, vá lá saber-se porquê, o livro que deveria naturalmente chamar-se "O que falamos quando falamos sobre corrida" foi artisticamente transformado em "Auto-retrato do escritor enquanto corredor de fundo"... Confesso que desconhecia a outra vida de Murakami, já tinha lido com deleite vários dos seus romances, aliás muitos deles best-sellers em todo o planeta ou não fosse ele um autor traduzido em mais de 50 línguas e sempre falado como candidato ao Nobel, mas não imaginava que também fosse um corredor, como eu... Parem de rir, já explico!





"Ganhar a este ou àquele não me diz rigorosamente nada. Interessa-me, isso sim, alcançar os objectivos que me propus, razão pela qual a corrida de longa distância se revela a disciplina ideal para um indivíduo com a minha mentalidade. Quem sabe o que é correr uma maratona do princípio ao fim, sabe do que falo. De uma forma geral, não se põe a questão de vencer alguém.  Os atletas candidatos à liderança da corrida, naturalmente, esses perseguem o objectivo de ultrapassar o seu rival mais próximo, mas, no caso dos amadores que correm por gosto, a rivalidade não é uma questão de fundo".



Murakami surpreendeu-me pelo universo pessoal paralelo que revela nestas deliciosas memórias, à semelhança das narrativas surreais com que nos brinda nas suas histórias, eles são gatos que conversam com pessoas, soldados que não envelhecem desde a segunda guerra mundial, carneiros do além, jovens munidos do dom da clarividência e tudo o mais de fantasmagórico num caldo onírico e mágico, o nosso herói, embora seja um escritor famoso revela-se uma pessoa deveras normal  e simples, com os seus sonhos e as suas banalidades, ao fim e ao cabo uma pessoa como nós que começou a correr para não engordar depois de ter deixado de fumar e começou a pouco e pouco a ganhar o gosto pela pela corrida! Um dia, quando decidiu ser escritor, descobriu que sem correr não conseguia  escrever! Tal como eu começou a correr pelos trinta e tal, tal como eu adora música e até tem bom gosto, tal como eu teve a curiosidade de saber os seus limites, desde corridas de 5 Km até às ultramaratonas foi uma questão de tempo, tal como eu foi-se desafiando sem nunca desistir, tal como eu pelos quarenta foi sentindo que não melhorava mais as suas performances e tal como eu encarou com naturalidade o declínio e a idade madura, e tal como eu ainda continua a correr e tal como eu ele pratica natação e anda de bicicleta, só que ao contrário dele eu não cheguei ao triatlo, ainda... Tal como ele também escrevo, mas ao contrário dele não escrevo sucessos literários, limito-me a escrever ideias e sensações emanadas pelo mundo-cão, muitas estão na gaveta, outras aparecem no blogue, outras ainda germinam na cabeça mas tal como ele não consigo escrever sem correr, ou antes, escrevo muito melhor quando corro... E também como ele desafiei-me até ao limite, embora eu tenha ficado pelos 42,195 Km e ele tenha ido muito mais além, e não sei sequer se alguma vez nos cruzamos nalguma maratona por aí, perdidos por entre dezenas de milhares de outros corredores, gostaria de o ter encontrado para correr ao seu lado nem que fosse durante um mísero quilómetro, não daria para muito mais porque ele dava-me uma hora de avanço, mas como o que interessa é chegar ao fim e ganhar o nosso desafio...   



"Murakami em Maratona, depois da primeira maratona..." - Foto: M. Kageyama


"A verdade é que estou mais velho e o tempo deixou as suas marcas. Disso ninguém tem culpa. São essas, por assim dizer, as regras do jogo. Tal como o rio corre em direcção ao mar, faz parte da ordem natural das coisas uma pessoa envelhecer e tornar-se mais lenta, não tenho outro remédio senão aceitar essa evidência. Pode não ser um processo muito agradável, e corro sérios riscos de não gostar do que me espera, mas, vistas as coisas, que escolha tenho?"


ARIGATOU GOZAIMASU, MURAKAMI!



João Pena-Seca

(Escritor de Valmedo)