LENTO SE FAZ O LUMINOSO CAMINHO...
São dez para as nove da noite deste 15 de Junho de 2021 e eu e o meu amigo Andarilho, embora epidemiologicamente separados em filas diferentes, achámo-nos confortavelmente sentados no Teatro Maria Matos aguardando a ansiada actuação de uma banda cujo nome o tempo se encarregou de legitimar, SEAN RILEY and THE SLOWRIDERS! De facto, estes vagarosos aventureiros, como diria o eterno trovador, lentamente vieram de longe, de muito longe e o que andaram para aqui chegar, senhor, e vão para longe, muito longe certamente porque não há limite para o génio e para o sonho...
Sean Riley é um
alter-ego nascido da cabeça delirante de um então muito jovem estudante em Coimbra,
Afonso Rodrigues, um apaixonado pela música e que compulsivamente ia compondo canções sem público destinado no recato do seu quarto até ao dia em que uma cassete sua seria descoberta por
Bruno Simões, figura então carismática da Rádio Universidade de Coimbra e onde todos se cruzaram, Afonso, Bruno e também
Filipe Costa, os três amigos e originais
Slowriders e que, movidos pelo gosto comum pelo
folk/rock/blues e pelo prazer de tocar, ainda bem que acharam que se deveriam juntar para fazer música...
Longo foi o caminho percorrido lentamente até aqui, como convém porque a pressa só complica e desvirtua as coisas, desde o primeiro concerto da banda em 2006 improvisado do nada e que impulsionou o sonho e daí até ao primeiro álbum, Fareweel, lançado no ano seguinte e que foi não só apenas mais um passo mas um grande salto, o disco tornar-se-ia numa obra de culto para muitos... Emoções fortes e primárias, assim pode ser definido o caminho para a luz desta malta, alegrias e mágoas, êxtases e tragédias, alegria de viver e medo do além, tudo se mistura em mais de 15 anos de histórias das quais, a mais marcante e incontornável porque para sempre será dolorosa, o desaparecimento do Bruno Simões, sem aviso e sem consolo, um carro abandonado em cima da ponte de porta aberta e chave na ignição, um músico misteriosamente desaparecido, assim relatavam as notícias em Junho de 2016...
Caramba, pensava eu enquanto não começava o show, a ironia do caminho do destino, exactamente há 5 anos atrás, 18 de Junho de 2016, continuava o Bruno desaparecido há dias, decorria o Euro em França e Portugal empatava 0-0 com a Áustria, resultado azedo devido à confrangedora exibição da selecção e a um penalty falhado pelo Ronaldo, ainda por cima ele que é especialista, mas ironia das ironias sem saber ler nem escrever acabamos por sermos campeões da Europa! Estou arrepiado agora, fecho os olhos e quando os abro vejo o palco escuro aguardando os lentos cavaleiros, aqui estou eu ainda arrotando aos caracóis que eu e o Andarilho petiscamos durante a tarde numa esplanada do Parque das Nações espreitando o ecrã para ver o Portugal-Hungria do Euro 2021 mas sem grande sucesso, a imagem não era nítida, valeu a conversa sobre o Chile, a Gabriela Mistral e outros tesouros, mas tudo acabou em bem, ganhámos à Hungria por 3 e desta vez até Ronaldo marcou de penalty, fez-se finalmente justiça... E depois, entre acidentes com amplificadores, discursos motivacionais e muita ironia à mistura, aconteceu o inevitável, um espectáculo feito de luzes e magia, de segurança e maturidade... Viva a vida, enfim!
LOVE LIFE, amor e vida, amor pela vida, usufruir a vida, que mais há afinal? Canções luminosas, prazer sem limites, afinal valeu a pena percorrer tanto caminho, música para a eternidade, a saborear lentamente...
Love Life
João Sem Dó
(Musicólogo de Valmedo)