quinta-feira, 24 de agosto de 2023

sábado, 5 de agosto de 2023


O RAIO CAÍU NA AREIA E O TIGRE BRILHOU!



Para que fique bem claro, para mim foi a melhor noite de sempre dos Sons na Areia, a fazer inveja a muitos badalados festivais da nossa praça, juntar dois incríveis shows de Luís Raimundo e Paulo Furtado, também conhecidos por RAY e LEGENDARY TIGERMAN, foi bastante mais do que colocar uma cereja no topo do gelado, foi uma delícia para os sentidos para quem gosta de música e que descambou numa magistral homenagem ao rock n' roll, essa filosofia de vida destes extraordinários músicos...  E passou também para o público a sensação de uma grande cumplicidade no percurso pessoal e musical destes músicos, nem sempre fácil e quase sempre doloroso, e agora que parece surgir finalmente o reconhecimento merecido continuam eles a fazer o que sempre fizeram afinal, tocar as pessoas em qualquer palco por mais humilde que seja, como foi o caso deste na Areia Branca... E bem hajam por isso... 


"RAY"


RAY, emancipado dos The Poppers e dos Keep Razors Sharp e iluminado pela figura tutelar de Paulo Furtado está feito um caso sério no panorama musical lusitano, um verdadeiro artista de faca nos dentes e lâmina de barbear afiada pronto a cortar a direito e a afrontar a música plastificada que invadiu as ondas hertzianas deste manso e pimba país...


"Ao desafio" - Tigerman vs Cabrita

 
E a noite acabou em verdadeiro delírio com o espectacular e lendário homem-tigre  apresentando novos temas do seu novo álbum e para mais com a participação do fantástico João Cabrita que faz maravilhas com o seu saxofone-barítono, especialmente no desafio com a guitarra do tigre... Só me resta agradecer à organização pelo convite e por esta maravilhosa noite de lua cheia! E até para o ano...  


João Sem Dó

(Musicólogo de Valmedo)


"Com ou sem motor, rumo a Porto Dinheiro"


Jean-Charles Forgeronne

(Fotógrafo de Valmedo)


TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XXVI

   
 VIVEIRO DE BONS AROMAS


Muito estranho seria se não houvesse bastante oferta gastronómica em Porto Dinheiro, terra de mar, e "O VIVEIRO" é um daqueles felizes casos de casas familiares que resistem há décadas e que vão passando de geração em geração mantendo a genuína qualidade de antanho... Quem é do tempo da humilde casa de outrora ao passar hoje por lá pode estranhar o edifício completamente remodelado e com uma bela esplanada quase em cima do oceano mas depois reconhecerá imediatamente que a qualidade continua garantida... A caldeirada que deu fama à casa e que me foi recomendada há anos por boca amiga como sendo a melhor de todo o oeste continua em alta mas hoje a opção recaiu na sardinhada que nunca desilude e para os que não gostem de peixe também há opções de carne que não comprometem... 





É domingo, habitual dia de romaria à praia e por isso recomenda-se reserva antecipada mas também coincide com a Festa do Mar e isso chama uma multidão ansiosamente à espera da tradicional vacada no areal e nada melhor do que mimar estômago e espírito alcandorados sobre o abençoado oceano...





João Ratão

(Chef de Valmedo)

Do tempo à beira do caniçal

 

(...) " Para Porto Dinheiro convergiram muitas atenções nos últimos tempos porque foi aí, numa das suas arribas, que foi exumado há alguns anos o Dinheirosaurus lourinhanensis, lagarto único da sua espécie que veio imortalizar a região. Mas todos os anos, em Agosto, acontece na praia de Porto Dinheiro uma festa especial, tão especial que afasta para longe a memoria da grandiosa descoberta paleontológica do saurópode e o visitante desprevenido que descer qualquer das encostas (mais prometedora a que vem da Atalaia) ficará deveras surpreendido com a encenação que aí terá lugar. Se há cento e cinquenta milhões de anos passavam por ali rios que vinham do arquipélago das Berlengas, nestes dias festivos, a praia, que por efeitos de linguagem já é por natureza uma arena, serena e pequenina, escondida lá no fundo, que por estar tão aconchegada pelas arribas parece um ninho, transforma-se num anfiteatro único ao albergar um redondel improvisado...





Ao pequeno porto, abrigo de meia dúzia de pequenas embarcações, há-de chegar a camioneta com uma garbosa e impaciente vaca brava. Tal como os homens também as vacas não se devem medir aos palmos mas salta aos olhos até do mais leigo em assuntos taurinos que estes exemplares que dão à praça nestes dias de festa não devem partilhar muito do código genético dos terríveis miura sevilhanos, estirpe mítica que até aos mais corajosos toureiros atemoriza. Mas não se pense que esta vaca vai ali fazer tristes figuras, não senhor, será com toda a dignidade que desempenhará o seu papel e de tal modo que ao fim de pouco tempo já conquistou o respeito da assistência.
Assim que o animal é introduzido no recinto começa a agitação da turba. Muitos limitam-se a passar a tarde a largar palavras de ordem, ora para o animal ora para os corajosos aventureiros. Nem que seja só para dar uma corrida pela frente da vaca e fugir imediatamente vale a pena ousar e comungar do susto e da alegria que invadem os corações, o da besta incluído. Afinal, a segurança das barreiras está a um curto passo. Mas há quem opte por fugir a nado pelo mar fora, embora a vaca às vezes não se faça rogada e também vá ao banho. E parece gostar já que de vez em quando torna-se necessário ir resgatá-la à água, cena que por não ser fácil se torna das mais engraçadas e aguardadas da tarde.






Se tudo correr bem, todos se safarão apenas com alguns arranhões e esfoladelas pouco profundas, ou então com algumas contusões sem importância mais devido à confusão da fuga do que às investidas da vaca. Ali não há ferros, nem curtos nem compridos e muito menos touros de morte. A vaca morre sim mas de cansaço e só então, quando exausta já não reage à populaça, é colocada de novo na camioneta. Aí pode finalmente repousar um pouco enquanto os carregadores e demais participantes vão até ao café do Chico Neto emborcar umas imperiais atremoçadas e trocar animados comentários sobre os momentos mais relevantes da lide. Quando o povo dispersa fá-lo já com saudades da vacada do próximo ano...


Excerto de "À beira do caniçal", de João Pena Seca