O VÍCIO DE ESCONDER A ARTE...
OU
BOTTICELLI E OS 210 DO VIMEIRO...

Dou comigo a pensar que a quantidade de obras de arte perdidas e desaparecidas deve ser tanta como aquela que os museus orgulhosamente exibem, tamanha é a frequência com que são achadas pinturas desconhecidas de famosos mestres, jóias há muito roubadas com a assinatura de grandes artesãos e até manuscritos de escritores dos quais se pensava não haver nem mais uma frase por analisar e dos quais ainda se descobrem novos textos em baús num sotão em obras ou numa dissimulada gaveta de escrivaninha perdida num armazém de velharias... E porque vem isto a propósito, podereis questionar, pois bem, tem tudo a ver com uma descoberta que eu próprio fiz acerca de outra extraordinária descoberta que aconteceu na Hungria enquanto tentava arrumar o meu sótão, assim do nada dei por mim com um exemplar do DN nas mãos, amarelecido e a desfazer-se, com a data de
10 de Junho de 2007, passam hoje exactamente 13 anos e no qual o que mais me chamou a atenção foi uma pequena notícia de rodapé a dar conta da descoberta de um fresco do grande
BOTTICELLI no castelo de
Esztergom, cidade do norte da Hungria à beira do Danúbio e a poucos passos da Eslováquia... Como é possível ainda haver obras desconhecidas dos grandes mestres do Renascimento? É assustadoramente possível a resposta ao enigma: alguém, tempos depois e inocentado pela mais genuína ignorância decide recuperar uma parede do castelo e decide pintar sobre umas imagens que por ali pairavam já gastas pelo tempo, à semelhança do que nos dias de hoje continua a acontecer, basta reparar no que se passa pela linda e pacata aldeia do Vimeiro...
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"Os 210 do Vimeiro" |
Estamos mesmo defronte das piscinas do Vimeiro, atrás de nós agoniam os arruinados balneários das termas e o que vemos pode não passar de 100 metros de um alvo muro, recortado em 11 bancos, cada qual com 9 pequenos azulejos pintados à mão e alusivos a tarefas domésticas e agrícolas, mas tudo junto perfaz a bela soma de 99 retratos da vida de uma comunidade e muitas mais memórias de um povo e de um lugar, ao todo são 210, 100 metros mais 11 bancos mais 99 azulejos... E que bem que o muro está preservado, diga-se, caiadinho há pouco tempo, pena é que por tremeliquice da mão, fastio da ocupação, ignorância da responsabilidade ou seja pelo que for, alguém demasiado decidido e de muito limitado tino desatou a caiar tudo a eito, passando por cima de tudo, azulejos incluídos!
Talvez não sejam de Botticelli nem de alguém célebre, afinal não interessa de quem são, são arte, e o que fica é a noção de que muitas vezes a arte, seja a grande pintura ou seja a arte popular, ambas merecedoras de respeito, fica sujeita às manias de quem a não merece ou de quem a não compreende... E a maior culpa não é de quem passou com a trincha de cal por tudo o que estava à frente mas sim de quem incumbiu tal artífice dessa tarefa e que ainda hoje não reparou no crime cometido... Santa ignorância! E com muitas outras obras magistrais da humanidade aconteceu exactamente o mesmo, foram escondidas, adulteradas e destruídas pela ignorância...
João Plástico
(Artista de Valmedo)
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