O CULTO DA NATUREZA SELVAGEM...
Hoje o mundo acordou sobressaltado à espera de mais um inglório e épico final e têm sido tantos os fins-de-mundo apregoados por profetas e profecias que parece impossível ainda estarmos vivos nesta realidade apocalíptica, desta vez parece que um matemático vidente descobriu que as contas sobre o calendário maia afinal estavam erradas, que o mundo não deveria ter acabado em 2012 (quem se lembra?), como de resto não acabou, mas sim, corrigido o erro, o mundo deverá certa e irremediavelmente acabar hoje, 21 de Junho de 2020, e porque não se sabe bem a que horas é melhor organizarmos um belo churrasco e uma festa pela noite dentro com os familiares e amigos não vá mesmo a coisa acontecer...
Mas amanhã, se o houver, e se cá estivermos ainda na vidinha de sempre é porque o mundo não terá acabado de todo mas será certamente um mundo diferente porque pequenos mundos vão deixando de existir neste frenético mundo-cão, como é o caso do mágico autocarro do lado selvagem...

E de facto os dois são indissociáveis, é até um caso raro em que um filme, neste caso realizado pelo Sean Penn, não desmerece o livro de Jon Krekauer, primeiro lê-se, depois vê-se e repete-se o ciclo as vezes que se quiserem sem qualquer ordem definida, ainda por cima tendo ambos uma história real por fundo que emociona meio mundo e a película uma banda sonora fabulosa e original a cargo de Eddie Vedder... Aliás, não é por acaso que a capa do livro editado pela Presença é uma foto retirada do próprio filme, em que Émile Hirsch contempla o horizonte. É a história de um jovem recém licenciado e filho de boas famílias com um confortável futuro pela frente que decide abandonar tudo e todos, vagueia sem destino em fuga das obrigações, da hipocrisia e dos valores corruptos em busca da liberdade no lado selvagem do mundo e do espírito, sempre em fuga para não se deixar envenenar pela civilização doentia... Claro que o mágico autocarro que lhe serviu de abrigo se tornou alvo de romarias, muitos tentaram recriar o percurso de McCandless, entretanto metamorfoseado em Alexander Supertramp, o super-vagabundo, mas sem a preparação adequada morreram pelo menos duas pessoas nos últimos anos e muitas tiveram que ser resgatadas in extremis... Compreendem-se as razões de segurança, também os souvenirs que muitos arrancavam ao mágico autocarro iam-no tornando num mero esqueleto ferrugento, mas fica para sempre o vazio, um buraco negro na memória, e eu seria bem um daqueles que era capaz de me aventurar pelo Alasca só para estar ali, no bus dos sonhos, da revolta, do lado selvagem...
João Palmilha
(Viajante de Valmedo)
Sem comentários:
Enviar um comentário