quarta-feira, 1 de maio de 2019


EFEMÉRIDE # 59


A TORTURA DO TRABALHO!


"No princípio o trabalho nasceu da tortura e hoje a tortura nasce do trabalho!"! 
  - Como explicas esta tua afirmação polémica, meu caro amigo Yuehan Kaluosi, filósofo taoísta de Valmedo?
   - Bem, meu caro João, tu melhor do que ninguém saberás entendê-la, como emérito linguísta que és, mas aqui vai: a palavra TRABALHO, em português e noutras línguas, deriva do termo latino TRIPALIUM, o qual designava um instrumento de tortura onde eram supliciados os escravos na sociedade imperial da Antiga Roma... Literalmente, o tripálio, também assim designado, era constituído por 3 (tri) estacas ou paus (palus) cravados no chão e aos quais eram amarrados as pobres criaturas para serem "tripagliadas", ou seja, trabalhadas, torturadas! Mas não eram só os escravos que eram "trabalhados", outros cidadãos incumpridores, por exemplo os que não pagavam as suas dívidas ou os seus impostos, também mereciam tal tratamento...
   - Queres tu ver, Yuehan, que com o crédito mal-parado que por aí vai ainda se ressuscita o maldito tripalium?
    - Nunca se sabe, basta pensares na escravidão de muita gente que trabalha!


TRIPALIUM

De facto, amigos, a visão esclavagista, torturante e deprimente do trabalho que ressalta das palavras do Yuehan ganham sentido quando atentámos que de tripalium derivaram a lusitana trabalho, a espanhola trabajo, a francesa travail ou a italiana travaglio, embora esta última hoje se aplique apenas ao "trabalho de parto", o trabalho comum por terras italianas é descrito por laboro, antes originário do latim labor que significa fadiga ou cansaço e que, curiosamente,  também deu origem ao labor inglês... Mas, por exemplo, na língua britânica, WORK já deriva do gaélico wikran que significa perseguição e também a palavra alemã para trabalho, ARBEIT, deriva de outra palavra germânica, arba, que significa escravo! E tudo ganha sentido se tivermos em conta que na Antiguidade só os escravos trabalhavam e que ser escravo era sinónimo de ser posse de alguém, ter um dono, não ser livre... E hoje, somos realmente livres, apetece perguntar?


O trabalho pode então ser encarado apenas como uma tortura, apenas um meio para que as pessoas possam ganhar um salário para sobreviver... E aí está o busílis, não se aplicará a todos mas a muitíssimos, o salário é tão bastas vezes tão miserável que se torna numa tortura! E não é irónico que, da mesma forma que ao aplicar sal numa ferida tem como consequência aumentar a dor, tratar o trabalho com salários miseráveis só pode resultar no aumento da revolta?
E porque hoje é o dia do trabalhador convém lembrar que neste preciso momento muitos milhões de pessoas estão a ser torturadas com trabalho, eu, por exemplo, sou uma delas, iniciei agora mesmo neste feriado o meu turno! E já ouço algumas vozes a resmungar coisas do tipo "a pior tortura é não ter trabalho", mas isso é bastante redutor, não acham?

João Portugal
(Linguísta de Valmedo)

1 comentário:

  1. Bravo, amigo João Portugal, "brillant". De facto nada como não ser obrigado para… isso aplica-se precisamente à obrigação de se dar a minha força de trabalho em troca de meia dúzia de patacos e verificar que a outra dúzia ficou nas mão do patrão. Agora, a origem, o significado de "trabalho", a origem desta aberração e a constatação que era uma forma de tortura aplicada em tempos remotos, está formidável. Gracias pela dica.

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