segunda-feira, 21 de janeiro de 2019



QUANDO AS BOAS IDEIAS SALTAM PELA JANELA....



JANELA, diz-se que é uma abertura ou vão na parede externa de um edifício ou de um veículo que se destina a proporcionar iluminação e ventilação ao seu interior ao mesmo tempo que permite a visibilidade da paisagem exterior... (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa)... A JANELA DO TEMPO contém, em si mesma, essa dupla faculdade, não só a capacidade de reavivar memórias frágeis que corriam o risco de se tornarem pó num qualquer carunchoso baú de sotão mas também a ousadia de permitir, num salto em frente rumo àquele azulado horizonte para além da Berlengas, qual errante voo de gaivota, a perpetuação da história, da sabedoria e da vida de uma comunidade pelas gerações vindouras...
Por isso, amigo leitor, abra a sua janela e mergulhe nas profundezas do mundo cão, para os tempos primordiais e para as eras futuras, para as memórias e para os sonhos...



Bendita a ideia de abrir esta janela e assim permitir a vinda para o nosso mundo de memórias resgatadas a uma morte certa numa qualquer gaveta esquecida...  Porque, fique sabendo o amigo leitor, se um dia destes se achar passeando pelas ruas da Zambujeira e Serra do Calvo, duas aldeias que se foram juntando até se tornarem numa só e que se não fossem as placas a meio da Rua da Liberdade a assinalar o fim de uma e o príncipio da outra ninguém notaria, talvez só ainda lá estejam por questão histórica, pode talvez ficar surpreendido pelas janelas que vai encontrar... São janelas mágicas que o vão transportar a outros tempos...



As Janelas do Tempo são quadros feitos a partir de fotografias originais e implantados no exacto local onde as mesmas foram tiradas há décadas, permitindo assimilar a transformação das aldeias ao longo do tempo ao mesmo tempo que exibe o rico património urbanístico e cultural, sejam os moinhos, as fontes, os lavadouros, a igreja, as ruas, o povo...

E as memórias são transversais, amigo leitor, não se restringem à zona da Lourinhã, comigo, por exemplo, qual espelho, mostram-me a esquecida  realidade de um Ribatejo profundo dos anos sessenta em que os primeiros automóveis iam chegando a uma aldeia de ruas lamacentas à espera de alcatrão e luz eléctrica... A Janela do Tempo tem esse condão, faz-nos viajar não só pelo tempo como pelo espaço, porque no mundo de então as aldeias eram iguais...

E depois, fotografias com quase um século mostram-nos como eram, por exemplo, os trajes de festa, aquela roupa que só se tirava do baú para as ocasiões festivas... Aqui me penitencio, amigo leitor, pela emoção com que observo estes instântaneos históricos, é que, veja bem, ainda sou do tempo em que existia o traje de domingo e o os outros....
E mesmo que tudo isto à primeira vista pareça estranho, mesmo que não seja a nossa realidade, nem a dos nossos pais, porventura, terá sido, seguramente, a dos nossos avós... E que pobres seremos se encararmos o futuro sem as nossas heranças culturais, que tristes seremos se não abrirmos a janela de trás, que dá para o passado, e a janela da frente, que convém escancarar, de olhos postos no futuro, com orgulho do que já passou!...

Este projecto das "Janelas do Tempo" convida-o a viajar no tempo e no sentimento, é um museu ao ar livre e um portal que o transporta a outro tempo, é uma ideia genial que saltou pela janela da imaginação e que devia ser replicada por tantas outras terras, tantas outras histórias, tantas outras vidas, tantos outros futuros...




A Janela do Tempo número 15, por exemplo, datada de 1933, ano da inauguração da Fonte da Serra, abastecedora de água à população desde tempos imemoriais, ali nas profundezas do vale que separa a Serra do Calvo da Abelheira, encerra uma maravilhosa lenda: ali mesmo, há séculos atrás, uma menina terá ido à fonte buscar água e aí encontrou uma Velhinha Moura que lhe terá perguntado:
   - Mas porque vens tão cedo buscar água, menina?
   - A minha mãe vai cozer pão e precisa de água!
     - Oh! Há tanto tempo que não como um pãozinho quente! - e a velhinha tirou do seu avental um besouro brilhante e deu-o à menina, dizendo:"Leva isto à tua mãe e diz-lhe para me trazer um pãozinho"...
Mas a menina assustou-se ao pegar no brilhante besouro e largou-o, desatando a correr para casa... Ouvindo a história, a mãe da menina apercebeu-se de que aquilo era uma benção, o besouro seria uma jóia em ouro que transformaria as suas vidas para sempre e desatou a correr até à fonte mas nem sinal da moura ou do besouro... Mas essa não seria a única desgraça a ocorrer na fonte: consta que uma das personagens mais queridas e carismáticas da aldeia de então, o Carlotes, com um copito a mais, se terá desequilibrado e morrido afogado ali mesmo...



João Alembradura
(Historiador de Valmedo)

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