FOTOBIOGRAFIA DE UM RIO - III
O ALMONDA
Tal qual as memórias, os rios não se devem medir nem aos palmos nem a léguas, desse modo o ALMONDA seria um pequeno rio, ridículo até nos seus míseros 30 quilómetros de viagem desde a Serra de Aire até ao Tejo, mas, se a sua medição for feita em beleza, sentimentos, afectos, lembranças e para quem conhece os milenares segredos que as suas margens encerram, então ele revela-se um rio grandioso...
Memórias exuberantes do passado são também as das ciclópicas cheias, outrora recorrentes quando se abriam as comportas do céu, era inebriante observar a força do rio quase a galgar a Ponte do Raro enquanto que junto à antiga central eléctrica, alimentada pela corrente, o turbilhão do remoinho era tal que levantava névoa digna das maiores cataratas...
Nessas ocasiões de deslumbramento pela força da natureza, o percurso a pé desde a Garagem dos Claras até à escola demorava o dobro ou triplo do tempo e por mais de uma vez fez-me chegar atrasado a certas aulas, enquanto no sentido inverso fez-me perder uma vez ou outra a camioneta certa, obrigando-me a esperar pela seguinte.
Depois, por recantos e mais recantos, o rio, saindo da cidade, estreita e amansa em direcção à planície, não sem antes, com pompa e na circunstância certa, galgar as baixas margens e dar vida ao Paúl do Boquilobo, um santuário da vida selvagem...
João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)
Tal qual as memórias, os rios não se devem medir nem aos palmos nem a léguas, desse modo o ALMONDA seria um pequeno rio, ridículo até nos seus míseros 30 quilómetros de viagem desde a Serra de Aire até ao Tejo, mas, se a sua medição for feita em beleza, sentimentos, afectos, lembranças e para quem conhece os milenares segredos que as suas margens encerram, então ele revela-se um rio grandioso...
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Nascente do Almonda |
O encantamento do Almonda começa logo pela sua nascente numa gruta com 15 Km de comprimento conhecido, escondida sob uma uma falésia da serra, mas que, dizem certos entendidos estudiosos do fabuloso carso, deve ser muito maior e deve comunicar com o Algar do Pena e outras grutas, incluindo a da nascente do Alviela! Este fabuloso mundo subterrâneo seduziu o espiríto aventureiro deste vosso curioso escriba de tal forma que, muito antes da gruta ter sido declarada Imóvel de Interesse Público em 1993 e da construção do seu Centro de Interpretação, em Vale da Serra, era ainda moço imberbe, se armou de coragem e na companhia do destemido Vítor da Zibreira desafiou as entranhas do monstro, apenas equipados duma pequena mochila com mantimentos, um cordel para marcar o percurso da descida e uma lanterna de bolso, numa operação arriscada que hoje poria em pé os cabelos de qualquer espeleólogo ou familiar vigilante... Felizmente tudo correu bem e entre rastejamentos, saltos, deslizamentos e alguma claustrofia ficou uma esperiência memorável para o resto da vida...
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O Almonda nas Lapas |
O Almonda volta a encontrar grutas ao passar-lhes por cima na aldeia de LAPAS, que como o nome indica, se construiu sobre terra esburacada pelo rio e pelos romanos... Pouco mais à frente, o rio serpenteia pela cidade de Torres Novas por entre chorões, laranjeiras, jardins e sob a vigilância prazenteira do imponente castelo. Por aqui, entre a Ponte do Raro e o Açude Real, evocam-se memórias das primeiras experiências marítimas a bordo de barcos a remos e, nos miradouros do jardim, abençoadas sobre as ramagens dos salgueiros, as primeiras abordagens românticas...
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O Almonda em Torres Novas |
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Recanto torrejano |
Memórias exuberantes do passado são também as das ciclópicas cheias, outrora recorrentes quando se abriam as comportas do céu, era inebriante observar a força do rio quase a galgar a Ponte do Raro enquanto que junto à antiga central eléctrica, alimentada pela corrente, o turbilhão do remoinho era tal que levantava névoa digna das maiores cataratas...
Nessas ocasiões de deslumbramento pela força da natureza, o percurso a pé desde a Garagem dos Claras até à escola demorava o dobro ou triplo do tempo e por mais de uma vez fez-me chegar atrasado a certas aulas, enquanto no sentido inverso fez-me perder uma vez ou outra a camioneta certa, obrigando-me a esperar pela seguinte.
Depois, por recantos e mais recantos, o rio, saindo da cidade, estreita e amansa em direcção à planície, não sem antes, com pompa e na circunstância certa, galgar as baixas margens e dar vida ao Paúl do Boquilobo, um santuário da vida selvagem...
Depois é apenas um saltinho até à Azinhaga, onde o Almonda faz a fronteira entre casario e planície num cenário de contemplação e pesca, para, passadas poucas centenas de metros e depois de muitas histórias deixadas pelo caminho, abraçar o Tejo...
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O Almonda na Azinhaga |
João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)
O meu amigo esgravateja por lugares incomuns plenos de luxúria, inebriantes que me deixam uns apetites de os explorar até saciar a minha curiosidade, qual Ivens.
ResponderEliminarBelíssimas imagens e bela prosa de encantar.
Um abraço, companheiro