quarta-feira, 19 de abril de 2017




DESEMBARQUE NA NORMANDIA - I



É uma manhã amena e solarenga de Junho de 1909 e a azáfama tomou conta cedo da Gare de Saint Lazare e, no meio da agitação dos passageiros que acabavam de chegar e das nuvens de vapor que as barulhentas locomotivas exalavam, passou despercebido ao mundo um breve mas intenso cumprimento entre duas personagens de riquíssima índole...  CLAUDE MONET acaba de chegar de Giverny, o seu recente e definitivo refúgio, vem à capital tratar de assuntos relacionados com uma futura exposição e MAURICE LEBLANC, embora mais novo vinte anos do que o grande pintor não o parece tal é o seu ar de cansaço após o extenuante trabalho que foi a publicação do seu segundo romance, vai ele em sentido inverso gozar um merecido repouso na sua NORMANDIA natal...   



Gare de St. Lazare - MONET
Monet já vai nos 69 anos de idade e já passaram mais de 30 desde que gastou dias inteiros a retratar a sua estação de comboio, ela fazia parte da sua vida tantas foram as viagens entre Paris e Vernon, até à casa de família na Normandia, onde sempre tinha à sua espera o estúdio e o encantado jardim onde ia beber inspiração.... E depois de tanto ter viajado e retratado, até ao fim refugiar-se-ia cada vez mais no seu lago de nenúfares que continuará a pintar sob mil luzes possíveis.... Ele, parisiense de nascimento mas que desde tenra idade, com a ida da família para a provincia, se fez parte daquelas paisagens intensas do norte.... 


Pelo contrário, Leblanc é um vero normando de ROUEN e apesar de viver grandes temporadas em Paris nunca renunciará à paixão pela terra natal... Filho de um construtor naval, com futuro tranquilo e assegurado portanto, nunca se sentiu confortável com a carreira empresarial da família, sentia-se mais talhado para a escrita e vai daí aventura-se por Paris onde aceita a extraordinária tarefa de criar uma personagem capaz de rivalizar com SHERLOCK HOLMES, um herói imbatível na altura... O desafio foi-lhe lançado por um  grande editor da época e assim, todos os meses, na revista "Je sais tout", sairá um folhetim com as aventuras do impagável ARSÉNE LUPIN, um charmoso ladrão e cavalheiro que levará por vezes o famoso detective de CONAN DOYLE ao desespero e à humilhação... Lupin é como que um Robin dos Bosques à francesa e a sua epopeia transformar-se-á numa autêntica sequela da guerra dos cem anos!.  



E enquanto Monet se vai recatando em Giverny, deixando-se enfeitiçar pelos reflexos da luz no seu lago de nenúfares, Arséne Lupin, pela imaginação desenfreada de Leblanc, vai deambulando por aí infernizando a paciência do inspector Ganimard, mas ambos voltarão a encontrar-se inevitavelmente nas falésias de ETRETAT, um pequeno paraíso à beira do Canal da Mancha, um lugarejo de pescadores à época mas que, em boa parte, viria a tornar-se num importante destino turístico devido à arte destas duas personagens....

Etretat não terá mais de 1500 habitantes mas tem aquelas que são consideradas as mais belas falésias de França e a sua praia de seixos foi considerada uma das três melhores da nação gaulesa, uma pátria recheada de tantas e tantas praias magníficas.... Para isso em muito contribui as formações extraordinárias das suas falésias de giz branco, em especial L'AUIGILLE, a agulha, uma proeminência de 70 metros de altura em direcção ao céu.... E se Leblanc a tornou oca para aí albergar tesouros inigualáveis à espera que Lupin os descobrisse, já Monet a retratou em busca da impressão da luz e do encantamento.....
O prazer da leitura e o deleite da imagem podem não equivaler ao objecto real quando ele é de uma beleza extraordinária, é normal que assim o seja, mas tornam eternas e profundas as sensações do observador ocasional... Não é necessário estar em Etretat para absorver Etretat... Não estando lá, basta Monet, Leblanc ou uma boa fotografia... 








Monet












Jean Charles Forgeronne

(Fotógrafo de Valmedo)

Sem comentários:

Enviar um comentário