OS DOENTES, OS LOUCOS E OS OUTROS...
Afinal, e sob o mote da doença na literatura, que se poderia esperar duma conversa com três exímios oradores a não ser uma hora e picos de deleite cultural? Junte-se a Miguel Real, escritor e professor de Filosofia mas também ensaísta e destacando-se nesta área como autor da série das Novas Teorias (do Mal, do Pecado, da Felicidade e outros)
"A doença é uma disfunção corporal (ou mental) e a literatura adora disfunções! Tudo o que é rotineiro, o quotidiano absolutamente normalizado pode aparecer mas como pano de fundo, o centro é sempre a disfunção. O amor, por exemplo, é uma disfunção. E a doença, como disfunção, torna-se uma narrativa literária!"
Fernando Pinto do Amaral, poeta, crítico literário e professor universitário, alguém que após 4 anos de curso de Medicina abandonou as ciências pelas letras não só por falta de vocação mas porque finalmente ganhou a coragem de enfrentar o destino familiar (o pai era médico) e que hoje, pé lá e pé cá, sente-se à vontade para dizer
"As pandemias são a defesa do planeta! Atenção: esta foi só um aviso, da próxima vez são três mil milhões que vão à vida!"
e por último, talvez por ser o mais jovem, Rogério Ribeiro, conterrâneo deste escriba e o único a enveredar por uma carreira científica, nomeadamente na área da investigação da diabetes. Paralelamente mergulhou a fundo e com paixão no universo da ficção científica, área em que para além de ter editado várias antologias e organizado eventos sobre o tema escreveu vários contos fantásticos
"A distopia, um mundo disfuncional, também é sinónimo de utilidade! As mulheres que escreveram outrora e que tinham a necessidade de pensar o mundo de uma forma completamente diferente utilizaram a doença e as pragas para criar um mundo sem homens, uma distopia que só era possível apresentar neste contexto porque de outra forma não seria possível falar sobre coisas que não eram na altura bem aceites..."
E depois o Morales leu Ângelo de Lima, poeta louco internado em Rilhafoles:
"Pára-me de repente o pensamento
como que de repente refreado
na doida correria em que levado
ia em busca da paz, do esquecimento...
Pára surpreso, escrutador, atento,
como pára um cavalo alucinado
ante um abismo súbito rasgado...
Pára e fica-se e demora um momento.
Pára e fica na doida correria...
Pára à beira do abismo e se demora
e mergulha na noite escura e fria
Um olhar de aço que essa noite explora...
Mas a espora da dor do seu flanco estria
e ele galga e prossegue sob a espora..."
João Vírgula
(Leitor de Valmedo)
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