EFEMÉRIDE # 87
QUANDO OS POMBOS CHEGARAM...
Quem, logo no início dos passadiços das Escarpas da Maceira, por instinto ou curiosidade decide abandonar os bonitos degraus de madeira artificial e subir à esquerda pelo antigo carreiro de terra batida até ao cimo do monte, e depois de uns duzentos esforçados passos que equivalem a uns míseros cem metros, será surpreendido por uma estrutura cilíndrica que o fará lembrar um moinho sem velas... "Que raio é isto?", interrogar-se-á...
A resposta ser-lhe-á então dada quando se aproximar mais um pouco e vislumbrar a placa comemorativa sobre a porta ferrugenta: trata-se, afinal, de um abandonado pombal construído em Janeiro de 1959 e que, passado apenas um mês, decorreria então um solarengo mas ventoso 26 de Fevereiro de 1959, passam hoje exactamente 62 anos, seria inaugurado com a sua primeira remessa de 75 pombos, ao que consta da raça especial barcas, uma das 350 raças diferentes criadas pelo homem desde que domesticou o selvagem pombo-das-rochas vai para uns dez mil anos! Pompa e circunstância terão havido certamente, nem que fosse uma singela mas genuína comemoração com pão caseiro da região acompanhado de queijo ou chouriço, um brinde à prosperidade e um foguete lançado aos céus da Maceira, mas hoje não se encontram registos de tal acontecimento, talvez só esteja mesmo gravado na memória de alguns idosos maceirenses que ainda se lembram de tal acontecimento...
Ora, como os pombos nos meios rurais não duram mais de 15 anos (nos ambientes citadinos então não passam dos cinco!) só se pode concluir que aqueles pombos heróis há muito desapareceram, e ainda que também os seus descendentes directos há muito se foram, aliás, as quatro gerações seguintes desses primordiais pombos da Maceira há muito que voam noutra dimensão, e de facto, garanto eu, nas muitas excursões que tenho feito aqui por estas belíssimas escarpas nunca ouvi um arrulhar por mais longínquo que parecesse e nunca vislumbrei um pombo que fosse pelos ares da Maceira... Nem sequer se vê um falcão por aqui, ele que se lança em voo picado a mais de duzentos quilómetros por hora em direcção à sua presa predilecta... Mas depois, ao olhar para o mundo encantado lá em baixo e vendo o Alcabrichel serpenteando suavemente por entre escarpas e salgueiros pensei: "E se os descendentes dos pombos da Maceira estiverem apenas a sobrevoar o mar, lá em baixo?"
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"Escarpas" - Jean-Charles Forgeronne |
João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)
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