LIVROS 5 ESTRELAS - XXXVI
TERAPIA NA DECADÊNCIA
Chega um dia e a decadência anuncia-se, primeiro com uma dorzita aqui e outra acolá, depois com episódios de fadiga que nos mostram que o organismo já não aguenta tudo como dantes, uns lapsos de memória à mistura e depois, paulatina mas inexoravelmente, sentimo-nos a envelhecer a um ritmo assustador, de há uns tempos a esta parte, por exemplo, quando me levanto depois de mais uma noite meia dormida meia insone os meus ossos desatam a estalar por todo o lado numa sinfonia que até faz levantar as orelhas curiosas do James... Às vezes dou comigo a pensar se não deveria investir numa terapia anti-decadência, à semelhança de Laurence Passmore, a personagem de "Terapia" de David Lodge que, apesar de ter uma vida invejável, um carro de luxo, dinheiro em quantidade mais que suficiente e um casamento de sucesso e dois filhos bem orientados na vida, e ainda uma amante para momentos platónicos, não consegue lidar bem com a idade nem com o seu aspecto nem com uma dor irritante que lhe apareceu do nada no joelho, sem diagnóstico nem tratamento que resolva, e assim vai sofrendo de uma inexplicável depressão e angústia existencial à boa maneira de Kierkgaard, com o qual se identifica...
Estas aventuras, descritas com um sentido de humor delicioso, tornam a leitura uma bela terapia para qualquer angústia ou estado depressivo...
"O resultado foi ter descoberto em mim uma curiosa e embaraçosa relutância em levar a cabo o objectivo amoroso da minha viagem e, no momento em que a bela Samantha me ofereceu todas as delícias do seu corpo sumptuoso, não consegui aproveitá-las. Havia qualquer coisa a deter-me, e não era o receio da impotência ou de fazer piorar a lesão no joelho. Chamem-lhe consciência. Chamem-lhe Kierkgaard. Tornaram-se uma e a mesma coisa. Acho que Kierkgaard era o homem magro que estava dentro de mim a lutar para sair cá para fora, e em Copenhaga conseguiu finalmente sair."
João Vírgula
(Leitor de Valmedo)
Sem comentários:
Enviar um comentário