TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XXV
OS AMIAIS, AS PAPOILAS E O CAPADO...
Há meses que eu e o Andarilho tínhamos sido desafiados pelo Maurício a fazer uma excursão até aos Amiais de Baixo para conhecer e degustar o prato emblemático da terra, o capado, mas a aventura continuava pendente de ocasião apropriada que conviesse aos três, tinha ele ouvido de boca amiga maravilhas sobre o manjar que era servido com extrema simpatia numa casa com o curioso nome TRIBO DAS PAPOILAS...!
Mas para mim havia ainda um grande mistério a esclarecer: como é que eu nunca tinha ouvido falar nesse tal capado, eu, que vivi até aos vinte anos a poucos quilómetros dos Amiais, que muitas vezes tinha visitado aqueles lados por causa da praia fluvial dos Olhos de Água, que lá tinha disputado clássicos de futebol, que tinha familiares que por lá andavam muito, eu que até tinha privado com alguns amienses colegas de escola como era possível nunca ninguém ter falado nisso ? Quis no entanto o destino que eu fosse obrigado a demandar com urgência e mais cedo do que o previsto as saudosas terras ribatejanas e agora que regressava mais leve por questão resolvida e com o estomago a dar sinal dou por mim a passar pelo cruzamento para os Amiais, "que diabo, os meus compinchas perdoar-me-ão certamente!" ditou-me a consciência e lá guinei em busca das papoilas...
"Hoje temos cozido!" - informou-me a simpática Aline assim que abanquei, como se fosse uma sugestão irrecusável e de facto seria caso para vacilar na escolha tomando como exemplo uma opípara travessa com o dito cujo que era levada com orgulho e como se de um andor se tratasse para uma mesa lá ao fundo... "Não, o cozido fica para outro dia, tem que ser o capado, afinal fiz muitos quilómetros para conhecer essa iguaria! Vai ser o meu primeiro capado!"... "Grelhado ou estufado?"... Optei, claro, pelo grelhado...
- "Não se vai arrepender!" - alguém lançou da mesa ao lado. - "Acabei de comer capado, venho comer aqui duas três vezes por semana!"... Dois clientes assíduos da casa, já de capado arrumado e a tomar café, amienses de gema e com muita história para contar ou não fosse a conversa e o convívio a melhor coisa que se pode fazer para gozar algum do tempo da reforma, que mais poderia eu desejar naquele momento?
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"A chefe (chef) Sónia espreitando da cozinha |
Conversa entabulada, falei do mistério que me inquietava, eu que era natural dos arredores e que nunca tinha ouvido falar de capado na minha vida até agora e a resposta veio célere do amiense mais falador: "Sabe, isto só tem para aí uns quinze, vinte anos, dantes as pessoas daqui comiam o capado apenas em casa! Ia-se ao talho buscar as costoletinhas do cabrito, sabe, na altura era a carne considerada de segunda e a mais barata! Depois alguém se lembrou de começar a servir o capado num restaurante e agora até já há um Festival que dura três dias!"... Mistério desfeito: já eu tinha imigrado quando o capado se mostrou ao mundo!
Entretanto cai na minha mesa a primeira leva de capado e com o solene aviso do simpático empregado: "Como é a sua primeira vez digo-lhe que o capado tem que ser comido quente, por isso, quando acabar estas traremos mais, ok?"... "Muito ok!", respondi inebriado com o aroma das costeletinhas que me inundava os sentidos...
-"E ainda bem que não pediu mal passado, é a pior coisa que se pode fazer, muita gente vem aqui e por ignorância pede o capado mal passado, como se de um bife estivesse a falar, nada disso, estraga tudo, tem que ser bem passado!" - disse o meu amigo amiense da mesa do lado com um gesto de despedida... E enquanto a chef e chefe Sónia ia espreitando amiúde da cozinha por detrás do campo de papoilas eu ia pegando à mão nas finas costeletas e roendo tudo o que pudesse, carne saborosíssima, afinal o segredo estava em castrar (capar) o cabrito à nascença para que o bicho ganhe mais gordura e peso e perca os odores sexuais...
João Ratão
(Chef de Valmedo)
Maravilha! Dessa maneira é reconfortante ser capado, nem que a voz soe fininha... :-)
ResponderEliminarEstiveste nos Amiais e não me disseste nada. Depois do capado vinha a calhar um abafado, um licor de maracujá ou uma ginjinha 'conventual' em Casével!
ResponderEliminarMea culpa, não tive tempo tempo de passar pelo Casal Maudente, mas espero passar aí em breve para ferrar o dente nessas iguarias de que falas...
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