PODE SER PASSADIÇO MAS É INESQUECÍVEL...
Passadiço é algo que passa rapidamente, algo passageiro, transitório, tinha-o lido há pouco tempo no insuspeito Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa e que ainda lhe juntava outro significado: passagem ou qualquer corredor de comunicação... E ali estava ele, de câmara em baixo, olhando com mais atenção e tentando ouvir o mais sumido som que lhe comprovasse o instinto: alguém o observava, tinha a sensação forte e desconfortável de que não estava só! E no entanto, se alguém chegasse ali naquele instante poderia com legitimidade desconfiar da sua condição mental porque ele, de facto, estava natural e fisicamente só! Estaria a ser vitima de algum desfasamento emocional ou neuronal? Seria que alguma reacção química cerebral aleatória estaria a interferir com os seus sentidos?
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"Passadiços do Mondego" - Jean-Charles Forgeronne |
Jean-Charles Forgeronne sentou-se antes que uma vertigem o fizesse cair daquele penhasco sobranceiro à Cascata Rosa, uma magnífica queda de água com cerca de 50 metros de altura que tornava aquele local mágico e cujo barulho da água a castigar as rochas ainda lhe era um pouco perceptível ali em cima... Lá em baixo, numa extasiante paleta de cores outonais, vislumbrava-se o vale ainda adormecido sob esparsos farrapos de nevoeiro, o Mondego por lá serpentearia na sua custosa e paciente viagem indiferente aos magotes de curiosos que tomavam de assalto os Passadiços, a novel atracção da montanhosa Beira Alta... Entretanto outro bando de barulhentos espanhóis (haverá povo que falará mais alto e sem pudor?) invadiu sem pedir licença o seu espaço de contemplação e de lá se veio não sem antes disparar mais algumas fotos mas ainda carregando aquela estranha sensação de que algo o transcendia, quem sabe se a mesma que Jesus Cristo terá sentido no Monte da Tentação? Andaria o Diabo por ali?
Dois dias mais tarde, regressado a casa e quase esquecido da transcendental experiência em plenos Passadiços do Mondego, Forgeronne sentiu um calafrio invadir-lhe o âmago ao ver com mais pormenor as fotos que tinha tirado, pormenores que então não tinha reparado ali surgiam na tela do computador em toda a sua nitidez... Fincou as mãos nos braços da cadeira para não cair, ali estava ela, a criatura seja lá o que for, bem visíveis os olhos, o nariz, a boca, até a orelha e os braços! Afinal tinha razão! Alguém o tinha observado, talvez um guardião da natureza, petrificado mas poderoso, ainda bem que assim era, um segredo a ser descoberto por quem se aventure por aquelas "Terras do Demo" magistralmente descritas pelo grande Aquilino Ribeiro há cem anos... Uma coisa era certa para Forgeronne, aquele mistério não era passadiço, iria acompanhá-lo até ao último dia...
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"Cascata da Ribeira do Caldeirão" - Jean-Charles Forgeronne |
João Iniciado
(Ocultista de Valmedo)
Estiveste mesmo mesmo, perto da terra do meu pai (Aldeia Viçosa). Belas paisagens, país extraordinário, gentes sem par (também as há ruins) ...
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