segunda-feira, 16 de novembro de 2020

 

A MISTERIOSA ORIGEM DAS PALAVRAS - XVII


A AMÉRICA DAS PATAVINICES...


No preciso momento em que escrevo as primeiras palavras desta crónica ainda não é conhecido o vencedor das eleições americanas nem se sabe sequer quando tal possa ocorrer, dentro de dias, de semanas, de meses? Ou para o ano se a coisa avançar para os tribunais? Ninguém sabe, coisa normal por aqueles lados em que o american way of life se tem vindo a tornar cada vez mais numa existência esquizofrénica ao ponto de cheirar a esturro e de levar-nos a pensar que já estivemos mais longe de uma guerra civil num país enorme e dividido e em que qualquer um pode andar armado até aos dentes a armar-se em justiceiro, desta vez não contra os índios mas contra a outra metade que pensa diferente, se é que a metade trumpiana pensa... No que toca a eleições, o grande país das conspirações e considerado o mais poderoso do planeta mais parece transformado numa república das bananas em que não há voto universal e em que um presidente pode ser eleito sem ser o mais votado, onde um presidente eleito pode ficar refém do Senado ou do Congresso, onde um presidente que não quer admitir a derrota ameaça com os tribunais e com a impugnação e até pode levar a sua avante, como se pode falar em democracia americana? 


E então, enquanto circulava de comando na mão pelos noticiários todos iguais em busca das últimas novidades sobre a grande eleição, desabafei para o James que se encontrava enroscado no seu cadeirão preferido:

   - Não percebo patavina disto, James!

E ele, que há largo tempo não dava sinal de vida, limitou-se a apontar o focinho para mim de orelhas levantadas naquele gesto que significa em linguagem canina que não estava a perceber patavina do que eu estava dizendo... E aí dei comigo a dar-lhe razão:

   - Tens razão, James, nem eu sei o que é uma patavina! Vamos lá descobrir isso... - e lá fui em busca de respostas deixando para trás as misérias do mundo e da América...

 

Obra de Tito Lívio, "Il patavini"

Ora, é do senso comum que a palavra PATAVINA tem na língua portuguesa dois significados: por um lado significa "nada, coisa alguma" e por outro também pode representar um "pateta, um idiota"; para além disso, dela se forma outra palavra, PATAVINICE, que por sua vez faz parte da famosa expressão  «dizer patavinices» que não é mais do que dizer parvoíces, coisas que não se entendem! E a culpa de toda estas patavinices recaem sobre um grande pensador, orador e historiador: TITO LÍVIO! Em tempos remotos chamavam os romanos PATAVIUM à actual cidade de Pádua, terra natal de Tito Lívio, célebre autor de "História de Roma", obra escrita com muitas patavinitas, isto é, termos ou expressões típicas do dialecto regional falado na cidade, o patavino, e por consequência incompreendido pelos forasteiros... "Não saber patavina" significava então não compreender o que o mestre escrevera e depois, ao longo dos anos em que Pádua teve desde o século XIII uma das mais importantes universidades europeias, especialmente no ensino de Direito, quem ignorasse os ensinamentos dali provenientes, ou seja, não saber o que ensinava a escola patavina era o mesmo que não saber nada de nada! 


Tito Lívio dizendo patavinices...

João Portugal
(Linguísta de Valmedo)

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