quarta-feira, 11 de dezembro de 2019



SELVAGENS, PORCOS E DELICIOSOS!




Bela iniciativa aquela que teve lugar na Moita dos Ferreiros, uma "Caminhada pelos Trilhos do Javali", esse bicho de má fama tão enigmático quanto interessante... Nos últimos tempos o porco selvagem tem-se tornado uma autêntica praga e a melhor forma de a controlar é a caça organizada, feita nas noites próximas da lua cheia já que é nessas alturas que o luar permite ver um pouco melhor o animal de pelagem negra ou castanho-avermelhada de hábitos nocturnos e retiro diurno. Mas desengane-se quem pense que basta pegar na arma e desatar a procurar a fera em plena floresta, tipo caça ao coelho ou à perdiz, isso aqui não resulta, é necessário atrair o javali através da comida e assim constrói-se um cevadouro, um local em que são deixadas durante uns dias umas iguarias apreciadas pelo bicho e que pode incluir desde nozes, a ovos cozidos, a milho... 


O cevadouro
Tapa-se o grosso do manjar com uns troncos grossos ou com umas telhas para se ter a certeza de que foram javalis que ali estiveram a banquetear-se pois outros animais de pequeno porte não terão a força suficiente para afastar aqueles obstáculos e se assim for então há que voltar a abastecer a "mesa" e fazer a espera quando houver luar e há que ser rápido e cuidadoso para não deixar nenhum vestígio que denuncie a presença humana... É que, apesar de ser fraco de vista porque os seus pequeninos olhos não lhe permitem ver com nitidez para além de uma dezena de metros e apenas ao nível da sua altura, o JAVALI tem uma audição e um olfacto extraordinários, consegue captar sons imperceptíveis para o ser humano e consegue cheirar comida e inimigos a mais de 100 metros de distância! E depois de termos visitado dois desses cevadouros ficamos a saber que, apesar de abastecidos de petiscos, o javali não porá as patas naquelas imediações durante dias porque ficou no ar o cheiro de dezenas de pessoas! É pena que não se possa aproveitar o poderoso olfacto destes bichos noutras situações, por exemplo foi noticiado há poucos dias que uma vara de javalis cheirou e destruiu cerca de 20 mil euros em cocaína que tinha sido enterrada numa floresta da Toscânia por um gang de narcotraficantes! Que bem se poderia dar a alguns daqueles javalis o crachat de agente das polícias especiais...
O palanque
E depois, na altura certa, durante toda a semana que antecede a lua cheia, lá sobe o pessoal para os palanques, abrigos construídos próximos e com boa visibilidade para os cevadouros, e é só esperar que apareçam os bichos e que haja boa pontaria! 
A banha
Outra coisa que os javalis adoram é chafurdar em poças de barro ou lama e que constituem para eles autênticos jaccuzis, e não é apenas por divertimento que se dão a essas "banhas", elas são vitais para a vida da espécie a dois níveis: primeiro permitem a regulação térmica do corpo uma vez que o javali não produz suor porque as suas glândulas sudoríparas ficaram atrofiadas algures no processo evolutivo e depois, e não menos importante, desempenham um papel decisivo na organização social pois na época do cio que decorre precisamente nesta altura - de Novembro a Janeiro - estão apenas reservadas aos machos adultos e dominantes porque permitem salientar odores corporais irresistíveis para as conquistas sexuais... 

E depois desta aventura pelo secreto mundo do JAVALI nada melhor do que conhecer o bicho na sua derradeira e deliciosa versão: fritada com arroz e legumes, delicioso! Para além do estômago fica-se com o espírito cheio porque é muito boa aquela sensação de termos feito algo de útil para controlar a praga, aquele que comemos já não chateia ninguém!




O petisco...

João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)

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