quinta-feira, 31 de julho de 2025

 
FOI BONITA A FESTA, PETER'S!

Embora por vezes coloquemos isso em causa porque nada de extraordinário acontece nas nossas pacatas agendas de vida por longos períodos de tempo, é certo que existem felizes coincidências, temos noção disso por causa dos relatos alheios que nos chegam pelos mais variados meios mas agora fomos nós os contemplados com essa sorte, a nossa estadia no Faial coincidiu surpreendentemente com a festa do PETER'S que comemorou no passado dia 18 de Maio os 100 anos de nascimento de José Azevedo, o verdadeiro Peter...

"Out" - Jean-Charles Forgeronne

E que belo gesto foi aquele do Peter's em comungar com toda a comunidade o sucesso da casa, sabe bem ver a estima e consideração retribuídas e não faltaram naquela inesquecível tarde de domingo a música, a animação e a simpatia que é apanágio da casa, e além disso, claro, o caldinho de peixe, as bifanas no pão e as sardinhas, tudo oferta da casa, e que bem que souberam! Seria demasiado exigir também o maravilhoso bolo de chocolate ou o gin como oferta, quem sabe se não acontecerá lá para 2125, nos 200 anos de aniversário, porque longa vida se deseja ao Peter's... E obrigado!  

"In" - Jean-Charles Forgeronne

João Palmilha
(Viajante de Valmedo) 
 
TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XXXVIII

PETER'S, PORTO DE ABRIGO...

Tudo se encontra lá, os marinheiros em escala e os outros marinheiros que dali já não têm vontade de partir, os viajantes como eu que vieram pelos ares mas que agora, encantados, prometem a si próprios ser marinheiros numa próxima vida, os aventureiros dos sete cantos do mundo-cão em busca de novas emoções, os turistas que um dia juraram conhecer todas as ilhas açoreanas e que ali aportam a meio do seu périplo, os habitantes da Horta ou os vizinhos das Angústias ou os dos Flamengos, toda, mas toda a gente a qualquer hora se pode encontrar no PETER'S...  

"Destino incontornável" - Jean-Charles Forgeronne

Porque o PETER'S é muito mais do que um café ou um bar à beira da marina e em que na esplanada com a montanha do Pico no horizonte se petisca algo ou então se bebe o obrigatório e afamado gin, já agora um gin único, talvez nem pela qualidade da bebida, provavelmente não será o melhor gin do mundo, mas uma coisa é certa: em lado algum um gin sabe tão bem e parece tão milagroso como ali, talvez pelo cenário, talvez pelo ambiente, talvez sobretudo pela tradição e pelas histórias maravilhosas que envolvem o estabelecimento, talvez por tudo isso junto, o Peter´s é universal, inevitável destino de romaria e de encantamento...

"Na esplanada..." - Jean-Charles Forgeronne 

No Peter´s bebe-se, come-se, descansa-se, fala-se, ouve-se, olha-se, ri-se, pensa-se, analisa-se, sonha-se, diverte-se, assentam-se ideias, traçam-se rumos futuros, fazem-se amigos, juram-se coisas, limpa-se a cabeça, não é apenas um porto de abrigo para os marinheiros e os outros, é sobretudo um porto de abrigo para a alma... 


João Palmilha
(Viajante de Valmedo)

domingo, 20 de julho de 2025

 
POEMA VULCÂNICO SOTERRADO

Chegados à Ponta dos Capelinhos assalta-nos a sensação de que acabamos de pisar a Lua ou outro inóspito planeta qualquer, o cenário é negro, saído de uma infernal fogueira o chão não é mais do que cinzas e rochas queimadas, nenhuma criatura habita este território fustigado pela labareda do vulcão... Ainda assim, ao fundo, a antiga Casa dos Botes e um muro revestido a azulejos pintados pugnam por dar cor a tanta aridez e transmitir mensagens que preservam a memória da tragédia ao mesmo tempo que avisam as gerações futuras de que neste paraíso atlântico nada é garantido... 


"O Mural" - Jean-Charles Forgeronne

Naturalmente os ventos continuam a espalhar cinzas e pó do vulcão a muita distância, a paisagem altera-se, o muro enterra-se a cada ventania e parte do belo poema que ali foi escrito escondeu-se nas entranhas do planeta, nem pá nem picareta à mão e eu a escavar com as mãos mas debalde, acabo desolado por não conseguir trazer à luz a misteriosa parte oculta que se esconde terra adentro... Talvez noutro dia, em que os tempestuosos ventos levem estas cinzas para outro lugar seja possível lê-lo na íntegra, mas não tenho mais tempo aqui e pior do que isso é não saber de quem é o poema, estará ele publicado em alguma obra? Dúvida atroz...

"O poema vulcânico" - Jean-Charles Forgeronne


"No ar calafrio
rebenta em cachão repentino
luzidio penedo.

O cachalote

É átomo naquele mar infindo
o bote.

Nas cavernas da alma
rosna pronto o medo
enquanto o latejar do mundo
cospe adamastores de fogo
denso.
Assoma à boca do tempo
um esgar suspenso

Que terra é esta
de tais perigos
cheia?
Que gente é esta
(...)    "


J.C
(Poeta de Valmedo)

"Casa dos Botes", Capelinhos - Pedro Braia, Ana Correia, 2022

Jean-Charles Forgeronne
(Fotógrafo de Valmedo)

 
A RAIVA DO VULCÃO - XII

CAPELINHO, CAPELO, CAPELÃO...

    No dia 27 de Setembro de 1957 teve início no Faial um dos acontecimentos mais importantes da história da vulcanologia do planeta mundo-cão, perto do ilhéu dos Capelinhos, então situado a 1 Km da costa da península do Capelo, deu-se uma violenta erupção vulcânica submarina que a grande altitude projectou uma colossal quantidade de cinzas e vapor de água! O depois chamado Vulcão dos Capelinhos só terminou a sua actividade no dia 24 de Outubro de 1958 e durante esses intermináveis 13(!) meses foi, como nenhum outro até agora, observado, documentado e estudado... Felizmente ninguém morreu mas o impacto da erupção foi tal que aumentou a ilha em 2.4 Km2 e devido à destruição de casas, terrenos agrícolas e pastagens obrigou ao êxodo de metade da população da ilha para a América!  

"Capelinho" - Jean-Charles Forgeronne

O Capelinho do Capelo transformou-se então num Capelão e debaixo de toneladas de cinzas e areias vulcânicas ficaram então soterradas outras toneladas de memórias e vivências das gentes que desertaram, como aquelas do Porto Comprido por onde passavam os homens originários de várias ilhas e que depois de pernoitar na Casa dos Botes abalavam com coragem para a caça à baleia... O farol, esse, que também deve ter muitas histórias por contar, ali continua de pé, como devem estar os faróis mortos...


"O farol" - Jean-Charles Forgeronne

João Lava
(Vulcanólogo de Valmedo)

quarta-feira, 9 de julho de 2025

 
EFEMÉRIDE # 111

O DIA EM QUE A ILHA VEIO ABAIXO...

De vez em quando a Terra espreguiça-se e treme para nos mostrar como somos pequenos e vulneráveis, quais ácaros na pele de um monstro levamos com uma valente coçadela e o mundo muda num instante, são avisos para nos levar a pensar que controlamos muito menos do que aquilo que pensamos e para isso basta lembrarmo-nos do que aconteceu exactamente há 27 anos atrás nos Açores...

"Antes..."
De facto, no dia 9 de Julho de 1998, as ilhas do Faial, Pico e São Jorge tremeram e muito por causa de um violento sismo que abalou em particular a zona da Ribeirinha, no Faial... A Igreja de São Mateus, por exemplo, que já tinha sido completamente destruída noutro sismo em 1926 e que, apesar do insuficiente apoio estatal e graças sobretudo ao empenho e às contribuições da população durante oito anos, tinha sido teimosamente reconstruída e reerguida exactamente no mesmo local, acabou por ser novamente destruída! E assim continua nos dias de hoje, em escombros, à espera de uma nova vida, diz-se que talvez ressuscite noutro local da freguesia, noutro sítio talvez mais abençoado... Por enquanto ali resta o esqueleto do templo, afinal uma memória bem viva da tragédia, um aviso para a efemeridade das coisas...

"Agora..." - Jean-Charles Forgeronne

"Antes..."
Também o Farol da Ponta da Ribeirinha não resistiu ao sismo de 1998 e por lá continua em ruínas...  Tendo iniciado funções em 1919, com a sua torre quadrangular de 20 metros de altura e quatro moradias anexas para alojamento de faroleiros e respectivas famílias, o farol, imortalizado por Vitorino Nemésio na sua obra maior "Mau tempo no Canal", foi durante décadas um fiel guia das embarcações que durante a noite demandavam as águas que unem as ilhas do Triângulo, Faial, Pico e São Jorge...


Hoje em dia quem orienta os marinheiros nocturnos do triângulo é um farolim instalado numa coluna metálica branca com 5 metros de altura, vai servindo mas perdeu-se o romântico encanto... 

"Memória..." - Jean-Charles Forgeronne

João Alembradura
(Historiador de Valmedo) 

"Marina da Horta" - Jean-Charles Forgeronne

 


 NA HORTA, COMO UM MARINHEIRO...

Como um marinheiro cheguei à Horta, de barco, a bordo do Gilberto Mariano, um ferrie que pode transportar quase 300 passageiros e uma dúzia de viaturas e assim baptizado em homenagem àquele que durante décadas foi um herói das travessias diárias entre o Pico e o Faial para entrega de correspondência, encomendas e o que mais houvesse...
Mantenho-me sentado, serei, qual indómito capitão, dos últimos a sair, não tenho pressa nem maleita, a travessia apanhara mau tempo nos dois canais e agora, espreitando por entre muitos passageiros ainda cambaleantes e de saco de vómito na mão como se de um troféu se tratasse, quais zombies, vou vislumbrando ao longe o casario e a marina aos pés do Monte da Guia...   

"O Mariano ancorado" - Jean-Charles Forgeronne 

Devido à sua divina localização a meio do Atlântico, a marina da Horta é uma das mais famosas e procuradas do mundo, porto de abrigo de muitos iatistas e e aventureiros de todos os cantos do planeta que vão deixando nos muros e no chão os testemunhos da sua passagem, também por recordação futura mas especialmente por temerem a lenda que vaticina de que se não o fizerem não chegarão ao seu destino... E consta que não há marinheiro que não acredite no destino!


Depois de percorridas em passo lento e atento a marina e a marginal, apertando a fome nada melhor que abancar no Café Porto Pim e à custa de uma generosa tosta mista e de uma cerveja fresquinha no ponto deixarmo-nos enlevar pela vista da montanha e da formosa baía, isto se não formos distraídos por um bando de irrequietos e afoitos pássaros que com uma desconcertante familiaridade poisam na nossa mesa à cata de migalhas... 


E mesmo que nos tenhamos esquecido do livro que andamos a ler demasiado devagar devido às exigências da viagem, ou do bloco de notas onde registamos impressões para não as darmos como perdidas logo na manhã seguinte, há sempre mensagens que nos captam a atenção e nos fazem sonhar... 


João Palmilha
(Viajante de Valmedo)