quarta-feira, 6 de novembro de 2019



A MISTERIOSA ORIGEM DAS PALAVRAS - X


NAQUELES TEMPOS EM QUE A  QUESTÃO NÃO TINHA BUSÍLIS ...


Diz o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa que BUSÍLIS significa o cerne da questão ou do problema, a dificuldade de algo, e o termo popularizou-se por todo o lado através da célebre expressão "AQUI (AÍ) É QUE ESTÁ O BUSÍLIS DA QUESTÃO" mas durante milénios nenhuma questão deste mundo-cão tinha o seu BUSÍLIS, simplesmente porque ele até à Idade Média não existia!




De facto, e segundo os meus amigos etimologistas italianos, foi no século XIV que o BUSÍLIS nasceu, precisamente em Itália e fruto de um acaso bastante curioso... Consta que nesses dias em que praticamente toda a cultura e conhecimento da Europa moravam nos mosteiros onde zelosos monges copiavam os manuscritos, não só os de teor religioso mas também os textos de autores gregos e romanos, um jovem monge copista e estudante de Latim meteu-se numa grande alhada ao chegar à frase "In diebus illis", que em bom latim significa "Naqueles tempos (dias)" e numa atrapalhação sem explicação deu outro sentido completamente diferente às palavras...




Uns dizem que foi por pouca sabedoria, outros por inexperiência, o certo que também não terá ajudado nada a forma como as palavras da frase estavam dispostas no texto que traduzia, é que uma linha terminava com metade da palavra diebus (in die) e a linha seguinte começava com o restante (bus illis) e para a história ficaria a forma como o rapaz solucionou a questão: "in die" passou a ser «no dia» e não arranjando tradução para "bus illis" deixou ir mesmo assim, inventando a palavra busíllis que seria entretanto imortalizada ao ser reproduzida noutras futuras cópias ao mesmo tempo que se tornava num quebra-cabeças para quem tentava decifrar o seu significado, ou seja, tornou-se mesmo no busílis da questão, no problema daquela obra...



Há ainda quem argumente que a confusão poderá ter tido origem no deficiente espaçamento das palavras do manuscrito que o jovem monge copiava e que o terá induzido em erro ao pensar que bus illis era uma só palavra... E a mim, que hoje tentei sobreviver por um par de horas sem os meus ÓCULOS de leitura, ocorreu-me outra possível explicação para o mistério: não teria o rapaz problemas de visão? É que a mim, por exemplo, sem óculos, as letras miudinhas tendem a juntar-se aleatoriamente e por vezes chegam mesmo a formar novas e desconhecidas palavras... Ora, o busílis da questão é que naqueles tempos, dentro dos mosteiros, não existiam ainda óculos decentes mas apenas pedras-de-leitura, isto é, pedras preciosas e materiais como o berilo e o quartzo que eram lapidados e polidos para construir uma lupa rudimentar que ajudava os monges nalgumas situações, talvez o equivalente a ler através de um fundo de garrafa...




João Portugal
(Linguista de Valmedo)

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