sexta-feira, 18 de outubro de 2019


MEDO, MEDONHO, MEDRONHO...


Com o Outono chega também uma nova paisagem e então parece que só temos olhos para aquelas típicas árvores de folhas caducas, amarelecidas ou avermelhadas, quase secas, prestes a cair ou que já no solo atapetam os caminhos e os trilhos... É essa a típica imagem desta época, feita de inúmeras árvores em striptease, mas se repararmos melhor, algumas, orgulhosas, teimam em continuar sempre verdes e exuberantes... É o caso do medronheiro! E até podemos passar por ele sem notar tal é a sua capacidade de se camuflar com outros arbustos e só quando olhamos para o chão imediatamente antes de pisar um redondo e enigmático fruto avermelhado é que paramos e olhámos, será que...


Medronheiro camuflado num carrasco de Moledo...


Veio-me agora à memória o primeiro contacto que tive com o medronho, teria pouco mais de uma dezena de anos de idade e tinha sido convencido pelo Sérgio, pelo QuimTó e pelo Marinho de que valia a pena a aventura, e assim, quais pequenos vagabundos, armados apenas de fisga e navalha, lá fomos numa bela tarde soalheira em excursão por ignotos caminhos do Ribatejo profundo em busca desse fruto proibido, uma boa hora de caminhada desde os Parceiros até aos arrabaldes de Casével, onde nos esperavam essas míticas árvores produtoras de álcool... Tinha sido avisado, cuidado que os medronhos embebedam, há que experimentar mas depois há que aguentar! A medo lá os comi, meia dúzia talvez, frutos ásperos e nada doces, e na viagem de regresso, animada e refrescada por muitos mergulhos num tanque de uma mina que descobrimos pelo caminho, pensei eu muitas vezes se afinal não seria tudo mentira, é que os efeitos da medronhada tardavam em aparecer... E mesmo nos dias seguintes, enquanto comia os medronhos que tinha trazido nos bolsos dos calções, convenci-me que afinal não havia razão para tão medonha apreensão... 




O medronheiro, de nome científico Arbutus unedo, que é como quem diz arbusto do qual só consegues comer um fruto, engraçada denominação devido ao sabor agreste do medronho, tem uma particularidade muito interessante: nesta altura convivem na mesma árvore belos cachos de flores brancas e muitos frutos de vivo vermelho! Isto acontece porque os frutos, os célebres e pequenos medronhos, demoram um ano  a amadurecer e assim coexistem com as alvas flores que irão dar origem aos medronhos do próximo ano!


Um ano de maturação para um fruto tão pequeno...

Plantado para a produção de AGUARDENTE, especialmente no Alentejo e Algarve, o medronheiro também existe no estado selvagem pelo Ribatejo, mas a melhor aguardente de medronho que bebi em toda a minha vida veio da zona do Estreito, ali pela Beira Baixa, pelas mãos amigas e caridosas do Jorge Humberto...

Mas nem só por cá medra o medronheiro, ele é espontâneo em toda a Europa, Norte de África e América do Norte... E, curioso, é a árvore de eleição da cidade de MADRID que tem como brasão um esperto urso a comer medronhos  de um belo medronheiro...



João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)

1 comentário:

  1. E de repente fiquei a conhecer uma data de coisas que desconhecia. Obrigado amigo João...

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