VIAGEM  AO INTERIOR DA TERRA - II

A importância da descoberta da Gruta do Pena foi tal que deu origem, em 1997, sob a égide do Instituto de Conservação da Natureza e da Floresta (ICNF), à criação do I Centro de Interpretação Subterrânea, justa e exactamente ao lado da entrada original para a gruta!!!

Lá em baixo, na obscuridade de um submundo misterioso e enquanto milhões de humanos dormem alienados à superfície, continuam as explorações espeleológicas para se tentar descobrir as ligações entre as grutas conhecidas do planalto e outras que algum pastor ou caminheiro de circunstância ainda há-de encontrar, por acaso ou por destino....

No reino das profundezas, em total obscuridade e anonimato, o   Santo Graal da espeleologia lusitana continua à espera de ser encontrado, a comunicação entre a Gruta do Almonda e os Olhos de Água, locais mágicos onde rios subterrâneos afloram à superfície e se passam a chamar Almonda e Alviela, caudais de água alimentados gota a gota pelo ambiente das cavernas do submundo....
E enquanto cá por cima tudo parece incerto e tumultuoso, um mundo pleno de catástrofes e desgraças anunciadas, ameaçado por guerras e calamidades e pior do que isso, sujeito às vicissitudes e inconsciência da humanidade, por baixo de nós reina a paz e o equilíbrio, é caso para dizer que o Céu, enquanto arquétipo de tranquilidade e felicidade, vive no subsolo e não nas alturas.....

Por exemplo, enquanto à superfície do planalto da serra de Santo António a temperatura pode oscilar mais de 40º Celsius, entre os 2 graus negativos e os 40 positivos, lá em baixo, na Gruta do Pena, a temperatura oscila apenas 1 (!) grau durante todo o ano, entre os 14 e os 15º C! E enquanto cá em cima o ambiente é sujeito a uma enormíssima pressão humana, poluição, poluição e mais poluição, seja química, física ou sonora, lá em baixo, a mais de 50 metros de profundidade, aquela que é a maior alteração que afecta o equilíbrio do sistema subterrâneo resulta da simples queda de uma gota de água que entretanto se desprendeu de uma estalactite e que, ao cair no solo da gruta, se vai dispersar em milhares de gotículas e dando, eventualmente, origem a uma estalagmite ou a uma coluna..... E enquanto na superfície todas as espécies de seres vivos se debatem com enormes problemas de sustentabilidade, nomeadamente com a poluição ambiental, nas cavernas do submundo reina um equilíbrio perfeito, frágil é certo, pois parece que basta o dióxido de carbono da respiração humana para alterar o ecossistema subterrâneo... Por isso mesmo, as visitas à Gruta do Pena são criteriosamente organizadas, existe um máximo de pessoas admitidas por cada visita e essas visitas são periódicas por forma a permitir a todo aquele frágil ecossistema recuperar das investidas dos curiosos humanos....

O nascer do Alviela...

É caso para dizer, que o que está em cima não dê cabo do que está em baixo.....

João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)