EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO - I
O tempo não é exacto, nem imutável, nem definitivamente passado...o tempo antes é relativo, sinuoso e ondulante, misteriosamente moldável... Se EINSTEIN já tinha teorizado no século XX todas estas e algumas outras qualidades do tempo eis que, há poucas semanas, Pedro Rolo Duarte e João Gobern evidenciaram a maravilhosa elasticidade do espaço-tempo ao mostrarem-me como um singelo minuto se pode transformar em horas ou dias!...
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HOTEL BABILÓNIA |
Por puro acaso, numa deslocação de automóvel à capital ligo o rádio e busco algo de interessante para entreter, eram exactamente 10 horas da manhã de um sábado luminoso e fiquei sintonizado no noticiário da Antena 1... Nem me ocorreu naquele momento que surgiria de seguida um dos mais interessantes programas da actualidade radiofónica nacional, o HOTEL BABILÓNIA, o qual nos últimos tempos raramente consigo acompanhar devido a horários de trabalho desconchavados... Mas este em boa hora o apanhei! O convidado era o Mário Augusto, conhecido crítico de cinema, a propósito do lançamento de "A sebenta do tempo", uma viagem alucinante às memórias de quem nasceu nos anos 60 e cresceu nos 70, desde leituras, televisão, divertimentos ou curiosidades do dia-a-dia de então.

Aquele minuto em que me liguei ao Hotel Babilónia transformou-se desde então em horas de puro prazer e (re)descoberta, quer na visualização de séries, quer em releituras ou até na recriação de brincadeiras estou revivendo aquela gloriosa época e surpreendo-me a cada "visita"... Embora me falte a inigualável arte de MARCEL PROUST (a quem "roubei" aquele maravilhoso título de romance) para transmutar o pensamento em sensação e para transportar das lembranças para o papel a beleza do gesto, a harmonia do movimento ou as impressões da mente e da natureza, queiram acompanhar-me então nesta busca do tempo perdido em que o protagonista é um jovem inocente mas intrépido aventureiro, de olhar sonhador e timidez disfarçada, habitante de um pequeno reino encantado do interior ribatejano, entre o Almonda e o Alviela, à beira da Serra d'Aire...
E porque teimou ele em se apresentar aqui de fato domingueiro comecemos pelo domingo na aldeia, um dia tão especial e solene que recriá-lo à boa maneira proustiana ocuparia vários volumes de uma extensa obra... Domingo, para além do dia da missa era o dia do café! Nem toda a gente ia à missa mas todo o mundo passava pelo café, poder-se-ia chamar CENTRAL como em milhares de outros sítios, mas era apenas o do Fernando, café e mercearia, o estabelecimento mais amplo e confortável das redondezas, reconhecido também pela sua modernidade, tudo o que era novidade aparecia primeiro aí, as cadernetas de cromos mais recentes, os gelados de última geração, a primeira bica a sair ou os melhores matraquilhos, até o primeiro mini-snooker com pinos do mercado era lá que tudo despontava... E também era lá que havia a maior televisão do burgo, como se poderia ver bem o TARZAN se não fosse ali? E depois, enquanto punham conversas de uma semana em dia e alinhavavam negócios de produtos e serviços agrícolas, os adultos jogavam à sueca ou à malha no largo enquanto nós assistíamos, bando de miúdos curiosos, isto se não fosse dia de uma grande cowboyada ou de grandes aventuras na Tarde de Cinema.....
J.C
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