quarta-feira, 25 de junho de 2025

 
TASCAS E ANTROS DE PRAZER - XXXVII

AS DUAS SARAS DE SÃO JORGE

Em São Jorge duas Saras esperam por nós, uma em cada ponta da ilha, de sorriso e conversa fácil cativam os visitantes e se a curiosidade for bastante desvendam com orgulho segredos e curiosidades da sua gente e da sua terra, coisas maravilhosas que não se encontram nos guias de viagens nem nas pesquisas internéticas, talvez não se conheçam sequer embora seja muito provável que sim pois isto de viver numa ilha com pouco mais de 8000 habitantes leva a que, mais cedo ou mais tarde, se conheçam todos e neste caso em particular ainda mais porque trabalham no mesmo ramo, afinal basta que a Sara de Velas vá almoçar ao Topo e que a Sara do Topo vá tomar um café a Velas... 


Nada melhor do que começar o dia em Velas a subir a Rua Manuel Arriaga, sem dúvida a rua mais bela de toda a ilha, admirando sem pressa a sua lindíssima calçada, passar ao lado do jardim e do edifício da Câmara Municipal e logo aí abancar na Pastelaria SUSPIRO para um pequeno almoço servido com carinho num ambiente acolhedor...

"Pastelaria Suspiro" - Velas

Não esquecendo que a produção de laranja é desde a primeira metade do século XIX um dos pilares da actividade económica de São Jorge torna-se então obrigatório acompanhar a irresistível e majestosa sandes de queijo da ilha com um sumo de laranja tão natural quanto delicioso, apesar dos sedutores bolos em exposição e do bom ar dos galões directos que vão chegando às mesas, tirados com mestria pela Sara e com espuma quanto baste, como convém... 

"O Caseiro", Topo

Despedidas feitas à Sara e com a promessa de regresso na manhã seguinte ala que se faz tarde que era hora de visitar as Fajãs da costa norte e depois ir almoçar ao Topo, no extremo sul da ilha... E é no topo do pequeno largo onde impera o Império do Divino Espírito Santo do Topo que que nos aguarda a outra Sara, no CASEIRO, casa típica e humilde mas que honra as tradições gastronómicas dos Açores, prepare-se amigo leitor para um buffet onde apesar das poucas opções tudo pode acontecer, hoje pode haver cabrito ou panados de polvo, amanhã poderá ser albacora ou feijoada, tudo depende das marés e das circunstâncias, nós tivemos a sorte de ser presenteados com carne de novilho guisada a desfazer-se e ainda com uma deliciosa massada do mar, e tudo, mas tudo caseiro! Vale a pena arriscar... E depois, pormenores importantes, o pão, o queijo da ilha e o vinho, quer branco quer tinto, são óptimos!   



Claro que não há preço que pague a simpatia nem as histórias desta outra Sara e a verdade é que no final a conta sai muito simpática ainda para mais quando já inclui a sobremesa que tanto pode calhar ser uma tradicional espécie ou então uma mousse de manteiga de amendoim, tão equilibrada que não dá para enjoar....

"Espécie e mousse"

João Ratão
(Chef de Valmedo)

segunda-feira, 23 de junho de 2025



 

"Fajã dos Cubres" - Jean-Charles Forgeronne

 
CUBRES, AMÊIJOAS E CAFÉ

Depois de longo tempo abafados por um denso nevoeiro que obrigava a redobrados esforços na condução e que não permitia sequer vislumbrar a Graciosa mesmo ali ao lado, abandonámos a estrada regional que bordeja a costa norte da ilha e iniciámos a abrupta e perigosa descida para a Fajã dos Cubres...
 - Será que vale mesmo a pena? Descer lá abaixo e depois não ver nada? - questionava a N., temerosa, mas a temerária decisão estava tomada:
 - Olha vês? O carro virou sozinho, ele é que tomou a decisão, já deve estar habituado a isto! - mas a suposta piada nem um tímido sorriso arrancou - Vamos e pronto, a pior coisa que pode acontecer é voltar para trás sem ter visto nada de jeito, há que arriscar... - mas a parte final da frase já me saiu com menor entusiasmo... 


"Cubres & lagoa" - Jean-Charles Forgeronne

E à medida que íamos descendo crescia o horizonte e a luminosidade, afinal sempre iriamos ver alguma coisa! E o que víamos? Verde e mais verde a ladear a sinuosa estrada e uma luxuriante vegetação a escorrer pelas falésias a pique, e lá em baixo, abraçando as lagoas e espalhado por toda a pequena planície, o verde vivo e rasteiro dos cubres, uma espécie de nome científico Solidago sempervirens, esquisito como todos os nomes científicos, e é uma planta cujo caule pode atingir os 60 centímetros de altura e donde irradiam numerosas folhas apiculares...

"Cubres & Santo Cristo" - Jean-Charles Forgeronne

Mas para além do facto de ser uma planta presente em todas as ilhas dos Açores, uma das principais características dos cubres são as inúmeras e pequenas flores que brotam dos seus caules e pintam todo o cenário de amarelo, mas ainda é cedo, nesta excursão por São Jorge ainda estava tudo demasiado verde... E ali, com a tão próxima mas para nós inacessível Caldeira do Santo Cristo a espreitar, o único local nos Açores onde se criam amêijoas, mas para atenuar a desilusão não é que é mesmo aqui, em plena Fajã dos Cubres, o local ideal para degustar essas amêijoas? Ali em cima, diante da igreja, lá está o café-restaurante que as serve, infelizmente ainda é cedo e o almoço já está reservado para o Topo, onde ainda reina o nevoeiro... Fica para a próxima...

"Café açoriano" - Jean-Charles Forgeronne

Mas ainda antes do almoço e até porque a manhã só ia a meio demandamos a Fajã dos Vimes, famosa pelo seu café! De facto, é ali o único local onde se cultiva café em todos os Açores! E lá chegados é só ir até ao Café Nunes e degustar o dito, para além de ser possível também visitar as plantações... Reza a lenda que no século XIX um emigrante açoriano trouxe do Brasil umas sementes de café arábica e que graças ao especial microclima da Fajã dos Vimes prosperou até aos dias de hoje... E que o café é delicioso lá isso é, é especial mesmo, afianço... 



João Palmilha
(Viajante de Valmedo) 

segunda-feira, 16 de junho de 2025

 
A ILHA DO DRAGÃO DEITADO

Com 54 Km de comprimento e 7 Km de largura máxima, a ilha de São Jorge é uma cordilheira vulcânica de forma oblonga e que com a sua costa recortada e os seus picos montanhosos fazem lembrar a silhueta de um dragão deitado e mesmo não tendo a certeza que está ele dormindo há quem lhe chame a ilha do dragão adormecido... Já Raul Brandão, quando visitou a ilha em 1924 e ia escrevendo "As Ilhas Desconhecidas" apelidou-a de ilha castanha devido à cor das rochas na Ponta dos Rosais...
E claro, teria que existir mesmo um dragão na ilha...

"O dragão acordado" - Velas - Jean-Charles Forgeronne 

Mas na Praça de Velas, até porque um e outro se completam, para além do dragão encontramos também mesmo ali ao lado São Jorge, primeiro na sua Igreja Matriz lindíssima e depois estampado logo no início da bela calçada da rua Manuel de Arriaga, açoreano e primeiro presidente da República Portuguesa...



  Mas São Jorge distingue-se também pelas suas mais de 60 (!) fajãs, essas pequenas planícies de terreno cultivável à beira mar e assentes em bancos de lava, e ainda pelo seu famoso e inconfundível queijo cuja produção foi incentivada pelos primeiros colonos flamengos que chegaram ao Topo por volta de 1480 ao verificarem que o clima nas zonas mais elevadas da ilha era semelhante ao da sua terra natal e ideal para a produção de queijo...

"Fajã do Ouvidor" - Jean-Charles Forgeronne

João Palmilha
(Viajante de Valmedo)

domingo, 15 de junho de 2025

 
ESCRITO NA PAREDE - XLV


"Velas, São Jorge" - Jean-Charles Forgeronne


 " Já percebi que o que as ilhas têm de mais belo e as completa é a ilha que está em frente."

Raul Brandão
(em "As ilhas desconhecidas")


"Em Pé e Deitado" - Jean-Charles Forgeronne

 
TEORIAS DA CONSPIRAÇÃO - XV 

AS PIRÂMIDES DOS ATLANTES

No dia 27 de Agosto de 2013 teve lugar na Câmara Municipal da Madalena, na ilha do Pico, uma conferência onde foram apresentados os resultados das primeiras sondagens arqueológicas das misteriosas pirâmides descobertas por dois arqueólogos, Nuno Ribeiro e Anabela Joaquinito, e que terão sido construídas antes da chegada dos portugueses aos Açores! Sim, amigo leitor, leu bem, existem pirâmides na ilha do Pico, e não são duas ou três, são cerca de 140! Construídas pelos Atlantes, logo disseram alguns...

"Pirâmide" - Jean-Charles Forgeronne

As pirâmides concentram-se no concelho da Madalena, são construídas em pedra e assemelham-se às egípcias e às maias e embora mais pequenas algumas chegam a atingir os 13 metros de altura e nelas foram encontrados artefactos como anzóis, pontas de metal, ossos, conchas ou fragmentos de cerâmica que, tudo indica, são muito anteriores à descoberta dos Açores pelos Portugueses em 1427! Além disso, as pirâmides apresentam características arquitectónicas muito peculiares como sejam câmaras no seu interior, degraus, pisos circulares, decoração no topo com pirâmides e, no seu conjunto, desenhando até  uma praça ampla para cerimónias... 

"Pedra e mais pedra" - Jean-Charles Forgeronne

Outro pormenor importante é o facto de as pirâmides estarem alinhadas no sentido sudeste/noroeste, orientadas em direcção ao vulcão do Pico e ao solstício de Verão, conferindo-lhe um cunho sagrado... E ali, ao lado do rendilhado basáltico das vinhas do Pico, estas construções despertam a curiosidade e a necessidade de investigação criteriosa pois parecem significar muito mais do que os populares maroiços de uso agrícola...

"Vinhas do Pico" - Jean-Charles Forgeronne

E que dizer ainda da pirâmide submersa descoberta em 2012 por um velejador português, Diocleciano Silva, a meio caminho entre São Miguel e Terceira, uma estrutura que o sonar da sua embarcação desvendou no fundo do mar e que terá 60 metros de altura e 8000 metros quadrados de base, à espera de ser investigada? 

João Iniciado
(Ocultista de Valmedo)

terça-feira, 3 de junho de 2025

 
EFEMÉRIDE # 110

CRUZAR AS PERNAS E AS PALAVRAS

O dia amanheceu sem chuva apesar de nas minhas costas o Pico teimar em esconder-se atrás de um nevoeiro de chumbo, olho para o dragão deitado à minha frente, que é como quem diz São Jorge, sento-me no agradável miradouro do Sara Village e deixo o sol iluminar-me a espaços por entre as nuvens neste oásis de beleza, o silêncio impera, apenas ao longe um pássaro ou outro arrisca um pio, vou sorvendo lentamente o café e desejando que o tempo pare...

"O acordar do dragão" - Jean-Charles Forgeronne

Cruzo as pernas, entrelaço as mãos atrás da nuca, fecho os olhos o máximo tempo possível e não querendo adormecer abro-os e então reparo no jornal abandonado na mesa ao lado, mostrando umas palavras cruzadas incompletas, alguém, talvez com pressa, tinha rabiscado algumas letras mas abandonara o desafio... Não resisti, nunca resisto a umas boas palavras cruzadas, ainda que em férias e roubando algum tempo de contemplação destas paisagens idílicas, mas como dizem que é bom para os neurónios acabarei por me perdoar...



E depois reparo num artigo do jornal em que faz referência à efeméride, passam hoje exactamente 100 anos que foram publicadas as primeiras palavras cruzadas em Portugal! De facto, no dia 3 de Junho de 1925 surgiram as primeiras palavras cruzadas em solo lusitano, num jornal sediado no Porto e chamado Sporting, e nada tendo o curioso caso a ver com futebol não deixa de me intrigar, como adepto do glorioso e como curioso das ciências e artes do oculto, que apareçam lá as palavras "sporting", "porto", "revista", "ganhar" e "santa"! E agora sinto um calafrio, penso se o destino não estará mesmo programado por algoritmos e questiono-me se esta não será uma mensagem vinda do além numa cápsula do tempo anunciando que nos dias de hoje, e fazendo a revista dos últimos tempos, para o Benfica ganhar ao Porto e ao Sporting nem a Santa lhe valerá?  
Abano a cabeça e volto a cruzar as pernas e a olhar para o dragão deitado...

João Portugal
(Linguísta de Valmedo)

"A caminho de Nesquim", Pico - Jean-Charles Forgeronne

 
CURIOSIDADES DO MUNDO-CÃO - LVIII

AS FEZES MAIS BEM-CHEIROSAS

Se no seu passeio à beira-mar por uma qualquer costa açoreana encontrar uma pequena "pedra" cinzento-escura, porosa, leve e parecendo-lhe bem cheirosa, amigo leitor, não a devolva ao mar nem a ignore, pode ter encontrado âmbar, um verdadeiro e raríssimo tesouro!
Um cachalote médio consome mais de uma tonelada de lulas por dia e as partes indigeríveis da lula, as suas peças bucais também conhecidas por bicos, são vomitadas mas, por vezes, algumas conseguem atingir o intestino e assim constituir um perigo para o animal em caso de perfuração; como defesa, o cachalote produz então no intestino o âmbar cinza, uma substância gordurosa produzida com o intuito de envolver os bicos e assim evitar a perfuração bem como facilitar a sua expulsão através das fezes... Para ter uma ideia, certo dia foram encontrados no estômago de um cachalote 18000 bicos de lulas! 


"Museu do Cachalote e da Lula" - Madalena do Pico

Quando encontrado no interior do intestino de cachalotes mortos o âmbar é uma matéria esbranquiçada e fétida mas se encontrada numa praia depois de anos e por vezes décadas a flutuar pelos oceanos apresenta-se cinzento-escura e com um cheiro único, exótico e transcendental, impregnado de aromas intensos, doces e amadeirados que os perfumistas traduzem em paixão e sensualidade... Desde há séculos pago a peso de ouro pela indústria da perfumaria, daí chamar-se também ao âmbar o "ouro flutuante", nunca ninguém conseguiu reproduzir a sua fragrância em laboratório pois é impossível reproduzir o ambiente intestinal do cachalote bem como a acção da água dos oceanos... Para tornar ainda mais preciosas e raras essas fezes perfumadas acresce que apenas um em cada cem cachalotes produz o âmbar!


Fonte: Ambergris Europe

João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)