sábado, 16 de agosto de 2025

 
E COMO VER O MUNDO-CÃO SEM CAPAS?

Reconheço, pode não passar de uma mania como outra qualquer mas geralmente e quando a normalidade dos dias assim o permite, uma das primeiras coisas que faço quando acordo ou quando a insónia me ataca é navegar pelas capas dos jornais que os sítios internéticos vão disponibilizando, infelizmente quase sempre a conta-gotas... Não sei quantas vezes foi através de uma capa de jornal e ao acordar que fui confrontado com um acontecimento extraordinário que ocorrera enquanto estava prisioneiro dos braços de Hipnos, mas a sensação que me assalta ao desvendar as primeiras capas do dia é a mesma que teria se estivesse estado fechado na escuridão durante uma noite inteira e então abrisse uma janela para a luz do mundo-cão, para a realidade... 


"A última i"

Posso até não aprofundar muitas das chamadas de atenção de uma capa mas também já me aconteceu ir comprar o jornal porque algo me interessou deveras, pode ser uma capa normal sem grande impacto mas também pode ser uma capa que é uma autêntica obra de arte, uma capa de jornal (ou revista), para além de seduzir o leitor para a compra da publicação pode moldar opiniões, influenciar pensamentos, criar discussões e por vezes algumas tornam-se até inestimáveis testemunhos históricos...  
E agora o mundo das capas está muito mais pobre, desapareceu o i, um reflexo afinal da crise que infesta o jornalismo, melhor, o verdadeiro jornalismo, porque o outro "jornalismo", o de plástico, ao serviço de interesses económicos e políticos, esse vai de vento em pompa com notícias cada vez mais plastificadas...
Obrigado i, pelas notícias e pelas capas... 

João Cacha
(Jornalista de Valmedo)

sexta-feira, 15 de agosto de 2025


INCRÍVEL HENDRIX, INCRÍVEL ALMADENSE 

De facto, o que é incrível é só agora eu ter conhecido o INCRÍVEL ALMADENSE! E imagino o desperdício, tantas devem ter sido as suas gloriosas noites que perdi, mas enfim, nem vale a pena tentar encontrar razões para tanto desencontro mas um dia haveria de acontecer e como se diz por aí acertadamente mais vale tarde do que nunca... Em boa hora chegou o desafio do amigo Andarilho, também ele com ganas de conhecer o mítico espaço e depois de bem aconchegados pelo "Velho Kurica" lá fomos à aventura que nem leões...

"Incrível Almadense" - Jean-Charles Forgeronne

O CINE INCRÍVEL, na zona velha de Almada, tem uma história de 100 anos de existência, foi inaugurado em 1925 e fica situado mesmo ao lado do edifício da sua proprietária, a Sociedade Filarmónica Incrível Almadense, esta fundada em 1848! A icónica sala de espectáculos começou por albergar peças de teatro, depois também cinema e mais tarde concertos de música, tendo por lá passado nos anos 80 muito boa gente dos primórdios do rock português, como os Xutos&Pontapés e os UHF... Talvez por isso ficou conhecido desde então para muita gente como o Rock Rendez-vous da margem sul...

"Memorabilia" - Jean-Charles Forgeronne

Espaço incontornável da cultura de Almada e da margem sul, o CINE INCRÍVEL tem tido uma existência conturbada, chegou a encerrar portas e a entrar em lastimável estado de abandono mas valeu-lhe a intervenção da Associação Alma Danada que em 2012 o salvou do desastre ao assumir a sua gestão... E hoje, apesar de alguns contratempos, ali acontecem inúmeros concertos, desde bandas de garagem a nomes consagrados da música portuguesa, desde sessões semanais de jazz a bandas de tributo, muito se passa por ali, felizmente... 

"Hendrix reencarnado" - Jean-Charles Forgeronne

E por ali passou há dias o Jimmy Hendrix, com mestria bem reencarnado na guitarra de Tiago Maia e muito bem secundado por Ricardo Dikk no baixo e Rui Reis na bateria, e depois de um belo serão é inevitável um regresso para breve, afinal o Incrível merece muitas mais visitas...

"Almada Velha" - Jean-Charles Forgeronne

João Sem Dó
(Musicólogo de Valmedo)

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

 
UMA VOLTINHA POR... - IV

"Chafariz das Cinco Bicas" - Jean-Charles Forgeronne

... Caldas da Rainha! Ou melhor, pela zona histórica das Caldas... É um pequeno mas muito rico passeio e que começa junto ao Chafariz das Cinco Bicas, datado de 1749 e o mais imponente dos três chafarizes mandados construir por D. João V para abastecimento de água à população... E porque estamos a falar de água numa terra de artes, mesmo atrás do chafariz, na área hospitalar mas de acesso público, encontra-se o "Jardim da Água", obra do ilustre ceramista Ferreira da Silva, merecedora duma visita... Desce-se um pouco, meia dúzia de passos e já é possível contemplar a icónica Praça da Fruta, desde o século XV um dos mais famosos mercados de rua de Portugal, com os seus toldos coloridos e bancas recheadas com a melhor fruta e os melhores legumes que se podem encontrar... Toda a gente ali desemboca, sejam os caldenses clientes diários ou forasteiros que vão de passagem para o trabalho ou turistas, consta até que excursões da terceira idade têm como ponto de paragem obrigatório este mercado de uma singular atmosfera...


"Praça da Fruta" - Jean-Charles Forgeronne

Depois de passar pelo mercado, se estiver num dia de sorte, pode em qualquer travessa ou esquina ser surpreendido ao cruzar-se com um dos pavões que habitam o Parque D. Carlos e que têm como passatempo preferido um passeio matinal pelas redondezas...

"Passeio matinal" - Jean-Charles Forgeronne

Ou então também pode ser surpreendido por uma chuva de chapéus coloridos, parece que é moda, há-os agora por todo o lado de norte a sul, mas estes aqui das Caldas, como não poderia deixar de ser, são diferentes, se olhar com atenção irá reparar que todos aqueles chapéus são machos, todos eles têm o seu caralhinho pendurado...

"Caralhinhos pendurados" - Jean-Charles Forgeronne

Depois da irreverência artística deixada para trás é inevitável não dar por si onde a história desta cidade começou, em pleno largo do Hospital Termal, considerado o hospital termal mais antigo do mundo, mandado construir pela Rainha D. Leonor em 1485... Não esqueça de contornar o edifício do hospital e contemplar a belíssima Capela da Nossa Senhora do Pópulo, se tiver sorte de a encontrar aberta não hesite, entre e deixe-se relaxar, irá encontrar alguma paz espiritual e vigor para o resto da jornada...   

"Nossa Senhora do Pópulo" - Jean-Charles Forgeronne

E agora que o calor aperta é hora de passear ou simplesmente descansar nas sombras do Parque D. Carlos, ou então se para aí estiver desperto ainda pode visitar o Museu José Malhoa, e a visita, garanto-lhe, vai valer a pena...

"Parque D. Carlos" - Jean-Charles Forgeronne

João Palmilha
(Viajante de Valmedo)
 
 
O MUNDO-CÃO PELO OLHO DO ARTISTA - III

"Capela Nossa Senhora do Pópulo", aguarela, Museu José Malhoa - António Vitorino

"Capela Nossa Senhora do Pópulo" - Jean-Charles Forgeronne, 2025

terça-feira, 12 de agosto de 2025


 ANTIDEPRESSIVO NATURAL...

Andamos tão ocupados nesta existência caótica e depressiva que não temos nem tempo nem cabeça para repararmos nas coisas mais simples desta vida, muitas vezes também elas as mais belas, e no entanto a natureza tem a todo o momento surpresas para nos deslumbrar, basta dar o primeiro pequeno passo e esperar que aconteça, a recompensa espera por nós...

"Ballerina Alien"- Jean-Charles Forgeronne

Noite de insónia, manhã gloriosa? Embora raro por vezes acontece, chego à praia de Vale de Frades, deserta, ainda meio mundo-cão dorme, entretanto da outra metade muitos já se encontram submersos pelo trânsito caótico a caminho do rotineiro trabalho e a maior parte já mergulhou a fundo nos braços lascivos e alienantes das redes sociais... E eu por aqui, em plena maré vazia, só eu, areal e o oceano! Bem, parece que afinal não estou sozinho, de tanto recuar o mar deixou curiosos despojos... 

"O couraçado" - Jean-Charles Forgeronne

De tanto empinar o nariz para absorver os cheiros a mar quase que tropeçava numa estranha criatura que parecia dançar para mim, uma bailarina alienígena sem dúvida, talvez vinda de Sirius, a estrela mais brilhante da noite e para onde se alinham as pirâmides egípcias... Dou um passo para o lado para me desviar da criatura dançante e quase piso outro ser de outro mundo, um bicho couraçado que tenta fugir às arrecuas e que não tem ar de querer fazer amizade... 

"Ioga estelar" - Jean-Charles Forgeronne

Parece que passei um portal e que entrei noutra dimensão e ao deparar com uma família de peludas estrelas fazendo ioga à beira da água sinto-me num mundo paralelo tão diferente daquele de onde vim há pouco e onde não entram stresses mentais, nem rotinas doentias e castradoras, nem guerras, nem políticos aberrantes, nem desportos fúteis e alienantes, nem pessoas mesquinhas, nem doenças terríveis, nem ameaças de desgraças, nem religiões absurdas...

"O Vigilante" - Jean-Charles Forgeronne

E então tenho a certeza que estou a ser observado, instintivamente olho em volta à procura da nave que deve estar por ali algures e de onde deve ter saído toda esta estranha vida, é que diante de mim tenho agora uma estranha bola de espinhos e onde descortino um olho que me olha com ar ameaçador, que sabe se a enviar dados sobre mim para o planeta de onde veio... 

"O planeta verde" - Jean-Charles Forgeronne

Só não consegui vislumbrar quem me atingiu com o raio verde, o tal da lenda de Verne, talvez dissimulado atrás de uma rocha, o certo é que fui assaltado por uma espécie de tontura, uma sensação de êxtase e quando recuperei e abri os olhos vi que estava noutro local da galáxia, estava num planeta verde... 
E pronto, sempre chega a hora de regressar ao mundo antigo mas agora, depois deste antidepressivo que me purificou a alma, já vou contando as luas para a próxima evasão...   

João Atemboró
(Naturalista de Valmedo)

sexta-feira, 8 de agosto de 2025


 VIAGEM A UM MUNDO PARALELO...


Em 1976 escrevia LOUISE WEISS, jornalista e política francesa, defensora dos valores europeus e assumida feminista:

"Por causa da rapidez com que a sociedade tem mudado neste nosso século, os mais velhos e os mais novos, que coexistem no espaço, já não coexistem no tempo. Andam pelas mesmas ruas, dormem debaixo do mesmo tecto, mas, por causa da acção da memória, vivem em planetas diferentes."
(in "Mémoires d'une Européenne")


Hoje, passados 49 anos, quase quase meio-século, esta leitura do mundo-cão é mais real do que nunca, basta substituir "memória" por "tecnologia digital"! Hoje velhos e novos vivem em mundos paralelos, só que pelo caminho, à velocidade da luz, vai-se perdendo a memória, e sem memória do que fomos e do que construímos não há chão nem sabedoria nem valores, o abismo fica perto...

João das Boas Regras
(Sociólogo de Valmedo)

terça-feira, 5 de agosto de 2025

 
TIRADAS DO GÉNIO - VII

APENAS UM DIA DE MAU GÉNIO

Era apenas mais um daqueles dias em que o genial e temido Professor Vitorino Nemésio estava com os azeites e em que numa prova oral de Cultura Portuguesa teve em sortes de lhe calhar pela frente um aluno que tinha sido seminarista e conhecido como um marrão a sério:
- Que espectáculos viu o senhor ultimamente? - começou Nemésio...
O aluno, surpreso, respondeu:
- Ultimamente não vi nenhum...
- Nenhum? Vá-se embora!
E chumbou-o.

                                                                   (Baseado em "Anedotas do Nemésio", Arnaldo Saraiva, 2016)


João das Boas Regras
(Sociólogo de Valmedo)