quarta-feira, 31 de julho de 2024

 

A SALADA DE TODOS-OS-DIAS


A meio da tarde entrara eu no choco, aquele estado amorfo e lânguido de não saber o que fazer nem de apetecer fazer seja o que for, tudo culpa do dia que continuava abafado e parvo, fenómeno comum aqui pelo oeste, sol nem vê-lo e ainda por cima anunciavam a chegada de mais uma leva de poeiras marroquinas, mas o pior era que estava vazio de ideias de jeito para o jantar e essa sensação, como muito bem sabem os meus amigos amantes de bons petiscos, é tão desagradável e perniciosa que dá ânsias de hibernar no sofá e só acordar para a vida amanhã... Mas eis que dou de caras com a salvação, ao abrir o frigorífico encontro escondido nas suas profundezas um polvozinho congelado, oferta da Grazi que por sua vez o recebera de um amigo pescador que o tinha resgatado às frias águas do atlântico de Ribamar...





SALADA DE POLVO À VALMEDO

Ingredientes:

- 1 polvo;
- 1 cebola branca pequena e 1 cebola roxa;
- 4 dentes de alho;
- pickles q.b. (opcional)
-1copo de vinho tinto;
- coentros;
- azeite (1 chávena), vinagre (1/3 de chávena), sal, pimenta e pimentão-doce;

Preparação:

- cozer o polvo; cozi-o numa panela, com um pouco de água, o vinho tinto e a cebola branca descascada até ficar tenrinho, (aproximadamente 1 hora ao lume),
- quando cozido, retirar o polvo, deixar arrefecer e cortá-lo aos pedaços;
- numa taça misturar ao polvo a cebola roxa, os alhos, os coentros e os os pickles tudo muito bem picado;
- depois é só temperar com o azeite, o vinagre, sal, pimenta e uma pitada de pimentão-doce, mexer muito bem e levar ao frigorífico uma a duas horas;

E pronto, a salada mais gostosa está pronta, capaz de compor qualquer santo e parvo dia com o seu sabor a mar, ideal  para animar a alma em qualquer ocasião e tão fácil de fazer... Bon appétit!


João Ratão
(Chef de Valmedo)

segunda-feira, 29 de julho de 2024

 

LÉGENDES ET MYSTÈRES AU PETIT-DÉJEUNER



"Palácio de Santos" - J.C.Forgeronne
Imagine o caro leitor a fazer o mesmo que ele fez naquela manhã do dia 25 de Junho de 1578: acordou, até cedo demais, e nervoso e inseguro vestiu-se e dirigiu-se à capela, e de joelhos na pedra fria, com seu fervor religioso orou e pediu graças para ele e para o reino e depois, ao passar pelo anjo do silêncio, despediu-se com um derradeiro olhar daquele ninho de conforto... Depois atravessou o pátio do palácio, calcando as pedras onde outrora assentava a ermida mandada erigir por D. Afonso Henriques, aquando da conquista de Lisboa aos Mouros, para albergar os restos mortais dos três santos miraculosamente resgatados ao rio pelo povo no século IV, daí o nome do bairro, e dirigiu-se então para o jardim...


"O último pequeno-almoço" - Jean-Charles Forgeronne

E então, à sombra de uma oliveira da qual ninguém sabe a idade, olhando o Tejo ao fundo, tomou o pequeno almoço numa mesa de pedra que passados 446 anos ainda resiste, não sonha El-Rei D. Sebastião que aquela será a sua última refeição no Palácio de Santos... Aquele a quem chamaram primeiro "o Desejado" porque evitava-se uma crise de sucessão e depois "o Encoberto" por ter desaparecido, descerá depois por entre os laranjais árabes até ao rio onde o aguarda a frota que o levará para a fatídica batalha de Alcácer Quibir, não sem antes se despedir da célebre colecção de pratos de porcelana chinesa, da dinastia Ming, que decoram um tecto piramidal em madeira talhada de uma sala de aparato, são 267 pratos ao todo mas dizem que já foram mais porque reza a lenda que sempre que ocorre uma catástrofe mundial cai um prato inexplicavelmente!  Não se sabe se caiu um prato quando o rei desapareceu misteriosamente em plena batalha, até porque uns dizem que morreu na peleja que terá durado apenas 4 horas, outros afirmam que só morreu 3 anos depois da batalha após cativeiro, outros relatam que ele apenas desapareceu sem dar nas vistas do campo de batalha, assim de fininho, e, pasme-se, ainda há quem jure tê-lo visto em Itália em 1598! Cá, por este cantinho abençoado, há quem ainda o aguarde com fervor, chegando numa manhã de nevoeiro...


"267 Mings" - Jean-Charles Forgeronne

Mas outro milagre ocorreu pelo Palácio de Santos: resistiu ao terrível terramoto de 1755, sofrendo apenas algumas rachas! Em 2007 e em boa hora, o Ministério dos Negócios Estrangeiros de França investiu 3 milhões de euros para a recuperação total do palácio, uma das suas mais belas embaixadas em todo o mundo, visitemo-lo pois antes que caia outra porcelana...


João Alembradura
(Historiador de Valmedo)

segunda-feira, 22 de julho de 2024

 

OS SANTOS, AS TRINAS E OS MARQUESES...


São quatro as ruas que desembocam mesmo em frente ao palácio, de noroeste a das Trinas, que desce da Lapa e assim chamada porque aí existia desde o século XII um convento da Ordem da Trindade que albergava freiras a quem o povo chamava de "trinas", de nordeste a da Esperança, quiçá assim denominada porque o povo sempre acreditou, todos os santos dias e até hoje, que o rei perdido no nevoeiro africano estaria prestes a regressar à sua última morada para pôr as coisas em ordem, de oeste a de Santos-O-Velho, rua que celebra o bairro onde, no século IV, alegadamente e jurado pela omnipotente e omniverídica Santa Igreja da Inquisição, terão sido originalmente sepultados os três santos mártires da efabulada história cristã de Lisboa e, finalmente, de leste, a calçada do Marquês de Abrantes, aquele que foi o oitavo da sua linhagem e que em 1909 vendeu o histórico edifício ao Governo francês... 


"Palácio de Santos" - Jean-Charles Forgeronne


Hoje, o Palácio de Santos, um dos mais belos palácios herdados da monarquia portuguesa, é a sede da Embaixada de França em Portugal e é classificada pelos diplomatas franceses como uma das três mais belas embaixadas francesas em todo o mundo! Surpreendido? Marque uma visita guiada e comprove, vale mesmo a pena...


João Conde Valbom
(Olisipógrafo de Valmedo)